quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

A FONTE DA DONZELA / JUNGFRUKÄLLAN / THE VIRGIN SPRING (1960) - SUÉCIA



MITOLOGIA, INOCÊNCIA E VINGANÇA

Vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, “A Fonte da Donzela” é um filme de arte. Um filme em preto e branco que narra história de uma família camponesa comum que incube sua filha, Karin (Brigitta Petersson), de 15 anos, de levar velas para a igreja da região em homenagem a Virgem Maria. Como reza a tradição, as velas devem ser ofertadas por uma virgem. 
Karin segue com um vestido especial acompanhada da serviçal, Ingeri (Gunnel Lindblom), que é tratada com certo desprezo pela mãe da adolescente por estar grávida e não ter um marido, servindo de um mau exemplo. 


Em determinado momento, a serviçal começa a ter medo de continuar o caminho pelo bosque e Karin ousa seguir sozinha. Ao encontrar dois pastores, acompanhados de um garoto, Karin é atacada, violentada e morta. Ingeri que resolvera alcançar a garota, apenas chega para presenciar escondida a barbárie. 

 
O trio chega à casa dos pais da menina (que nada sabem do ocorrido) e pedem para passar a noite. Estes lhe oferecem abrigo e comida, porém quando um dos peregrinos resolve vender o vestido que a jovem usava para a mãe de Karin, tudo muda. Os pais percebem o ocorrido e tramarão uma vingança.



Colocando temas como cristianismo, mitologia nórdica, vingança, ocultismo, inocência e inveja, Bergman conseguiu transmitir todos esses elementos ao longo da trama: os pais são fervorosos cristãos, enquanto Ingeri ainda cultua o Deus Viking Odin, numa conotação de que o cristianismo ainda não havia se tornado a religião principal e muitos ainda adoravam outros deuses pagãos.  Ingeri inveja Karin, por ser paparicada e ter um destino melhor que o seu. Karin demonstra uma inocência muito grande, uma menina que não conhece o mal que o ser humano pode causar. 

 
Na cena dos bandidos travestidos de peregrinos / pastores, passa a impressão do conto de chapeuzinho vermelho, aqui com os lobos (verdadeiros) maus. Conceitos, como fé e doutrina cristã, serão postos em cheque quando a família descobre o destino de sua filha. 

 
A ambientação (século XIV), o apuro visual, a cargo do diretor de fotografia Sven Nykvist, os diálogos e a interpretação de Max Von Sydow, que mostra todo o seu desespero e ódio em uma cena em que Töre arranca uma Bétula (um tipo de arvore) é um dos pontos alto do filme que, apesar de antigo, mostra que com um bom roteiro e um excelente diretor pode-se fazer um filme simples, porém impactante. E é exatamente isso que nos é mostrado.  As cenas de violência contra a menina, apesar de datarem de 1960 e serem de um filme sueco, são fortes, conseguindo transmitir a exatidão de sentimentos inerentes à situação. 



O diretor Bergman já havia feito dois de seus melhores filmes: O Sétimo Selo e Morangos Silvestres. Ambos abordam a morte de uma maneira pessoal. O primeiro, um confronto nos tabuleiros de xadrez (o desafio contra a morte). O segundo, um homem repassando sua vida e vendo o seu fim se aproximar (o desafio contra o tempo). A Fonte da Donzela entra nessa seara e mostra a morte de forma brutal, através de um ato vil e repulsivo (o desafio contra Deus). É a fase metafísica (doutrina que busca o conhecimento da essência das coisas) de Bergman.  Um duelo entre o bem e o mal. A jovem vs os pastores. Inocência vs maldade. Deus vs Diabo. Perdão vs revanche pessoal. O mais interessante é que o diretor renegou sua obra, taxando-a de ser sem conteúdo e matéria. O filme ganhou status de cult e seu monólogo final é sempre lembrado.

Grandes atores e excelente diretor, em um filme simples por fora e complexo no seu interior.

Curiosidades:
O filme inspirou o diretor Wes Craven a realizar o filme Aniversário Macabro / The Last House on the Left (1972).

Em Portugal recebeu o título de "A Fonte da Virgem"

Roteiro de  Ulla Isaksson baseado numa balada medieval "A Filha de Töre em Vangé".

Conquistou o Oscar e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro.

O guardião da ponte interpretado por Axel Slangus é claramente considerado Odin. Ao lado de seus comentários sobre reconhecer Ingeri como se eles já tivessem se encontrado antes (sugerindo claramente que ele ouviu sua prece no início do filme), há várias referências à tradição Odínica na cena. Antes que o guardião da ponte apareça, um corvo está sentado do lado de fora de sua cabana. O corvo era considerado sagrado para Odin. Quando o guardião da ponte finalmente é mostrado de perto, podemos ver que ele tem um olho, o que é a característica mais proeminente de Odin, tendo sacrificado um olho para obter sabedoria. Finalmente, quando Ingeri se senta no assento alto, ela de repente tem uma audição aparentemente clarividente. Este é um aceno para o alto funcionário de Odin, Hlidskjalf, de onde ele podia ver todas as coisas acontecendo no mundo.

O roteiro é baseado na balada medieval sueca "Per Tyrssons döttrar i Vänge".

Inspirado em "Rashomon" de Akira Kurosawa. Ingmar Bergman chamou o filme de "uma péssima imitação de Kurosawa".

Wes Craven se inspirou neste filme para realizar seu filme de terror Aniversário Macabro (1972).

Max von Sydow é apenas dez anos mais velho que Birgitta Pettersson, que interpreta sua filha neste filme.

Mencionado na música do Van Halen, The Seventh Seal.

Esta foi supostamente uma história verdadeira na Europa em tempos medievais; em seguida, foi traduzido para um conto popular europeu; em seguida, foi transformado neste filme vencedor do Oscar de Igmar Bergman; A Fonte da Donzela; em seguida, foi transformado em um famoso filme de terror de 1972 chamado "Aniversário Macabro"  (Last House on the Left - 1972); qual é a versão mais famosa e bem-sucedida desse conto; em seguida, foi refeito no filme "Chaos" em 2005; em seguida, foi refeito novamente em 2009 com o filme "A Última" Casa (2009); portanto, houve muitas iterações deste conto.

Cartaz :



















Filmografia Parcial:
Max Von Sydow: (1929 - 2020)











O Sétimo Selo (1957); Morangos Silvestres (1957); No Limiar da Vida (1958); O Rosto (1958);  A Fonte da Donzela (1960); Através de um Espelho (1961); Luz de Inverno (1963); A Maior História de Todos os Tempos (1965); A Morte Não Manda Aviso (1966); A Hora do Lobo (1968); Vergonha (1968); A Paixão de Ana (1969); O Exorcista (1973); Três Dias do Condor (1975); O Guerreiro do Futuro (1975); O Exorcista II - O Herege (1977); A Morte ao Vivo (1980); Flash Gordon (1980); Fuga Para a Vitória (1981); Conan, o Bárbaro (1982); 007 - Nunca Mais Outra Vez (1983); A Morte nos Sonhos (1984); Duna (1984); Hannah e Suas Irmãs (1986); Pelle, o Conquistador (1987);  Tempo de Despertar (1990); Um Beijo Antes de Morrer (1991); Europa (1991); Cidadão X (1995); O Juiz (1995); Amor Além da Vida (1998); Insônia (2001); Intacto (2001); O Escafandro e a Borboleta (2007);  A Hora do Rush 3 (2007); Solomon Kane - O Caçador de Demônios (2009);  Ilha do Medo (2010); Robin Hood (2010); Star Wars: O Despertar da Força (2015); Game of Thrones (seriado 2016) 


Ingmar Bergman:
Mônica e o Desejo (1953); O Sétimo Selo (1957); Morangos Silvestres (1957); A Fonte da Donzela (1960); Através de um Espelho (1961); Luz de Inverno (1963); O Silêncio (1963); Quando Duas Mulheres Pecam (1966); A Hora do Lobo (1968); Vergonha (1968); A Paixão de Ana (1969); Gritos e Sussurros (1972); Face a Face (1976); Ovo da Serpente (1977); Sonata de Outono (1978); Da Vida das Marionetes (1980); Fanny & Alexander (1982).

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