segunda-feira, 2 de novembro de 2015

O DESESPERO DE VERONIKA VOSS / DIE SEHNSUCHUT DER VERONIKA VOSS (1982) - ALEMANHA







O OSTRACISMO DE UMA ESTRELA ALEMÃ NO PÓS-GUERRA

Jornalista esportivo, Robert Krohn (Hilmar Thate), conhece a outrora estrela do cinema alemão, da época nazista, Veronika Voss (Rosel Zech). Logo se estabelece entre ambos uma relação de amor, dependência e rejeição. Aos poucos Robert começa a conhecer o mundo pouco glamoroso de Verônica, uma mulher que amargura o ostracismo, vive de aparências e frequenta a estranha clínica da doutora Dra. Katz (Annemarie Düringer).


Vencedor do Urso de Ouro no Festival de Berlim de 1982, “O Desespero de Veronika Voss” é baseado na vida da atriz alemã Sybille Schmitzuma (ou Sybille Schmitz), estrela dos anos da guerra que perdeu seu status. Fassbinder resolveu criar uma história a partir dos relatos que descobriu, criando um filme que completa a trilogia de seus filmes que abordam o pós-guerra na Alemanha: "O Casamento de Maria Braun" (1979) e "Lola" (1981). Todos os três filmes lidam com personagens diferentes (embora alguns atores se repitam em papéis diferentes) e enredos, mas cada um se concentra na história de uma mulher específica na Alemanha Ocidental após a Segunda Guerra Mundial. Fassbinder ao lado de Werner Herzog, Volker Schlondorfe e Win Wenders foram os maiores representantes do chamado Novíssimo Cinema Alemão.


Em "O Desespero de Veronika Voss" vemos um filme em preto e branco que se justifica na frase da personagem Verônica: "luz e sombras são os dois segredos do cinema".   Não por acaso veremos as luzes no rosto de Verônica quando estiver doente, dando-lhe uma aparência similar a um fantasma. 


Veronika não aceita o ostracismo, não aceita que sua breve carreira de estrela tenha despencado com a Alemanha nazista onde outrora fora uma grande estrela e hoje é lembrada pelos poucos fãs. Veronika quer ser reconhecida, mas finge não querer. Quer ostentar, mas está praticamente falida, pois o vício lhe tomou suas posses (como o espectador descobrirá). Sua relação com a psiquiatra Dra Katz é de submissão, mas há algo mais escondido nessa situação que o espectador e Robert vão aos poucos descobrindo. 



A sociedade pós-guerra de Fassbinder é decadente, sem esperanças e de muitas incertezas. O vício de Veronika e de outros personagens é um paliativo para a dor do esquecimento, a dor do sofrimento na guerra e do medo do que virá. O medo pelo desconhecido pode ser um fator extremamente atenuante em situações pós-guerra. O espectador percebe que esse "trauma de guerra" afetou várias pessoas em diversas camadas e abriu um rentável mercado para aqueles que só querem esquecer.


Fassbinder (que coescreveu a história) criou o personagem de Robert Krohn, o jornalista esportivo, que resolve investigar a vida de Veronika. Viciada em morfina, Veronika consegue enfeitiçar Robert que já vivia com outra mulher e cria um curioso triângulo amoroso, onde temos uma Veronika que quer ser amada, mais no sentido de idolatria que no sentimental e uma Henriette (Cornelia Froboess) que mantinha uma relação estagnada com Robert e que, de repente, percebe que não quer perdê-lo. Henriette permite o relacionamento entre Robert e Veronika por uma total falta de possibilidade de reação e até, de certa maneira, submissão.


A aposta do cineasta em não fazer colorido foi mais do que acertada, pois insere o espectador direto na época da produção, além de "dar cor" à agonia de Veronika. O branco da clínica dá um sentimento de distanciamento, clausura e claustrofobia. Uma tentativa de passar a impressão de pureza, onde esse aspecto passa longe. A luz forte transmite apatia à figura de Veronika, um recurso muito bem utilizado no filme. Em outros momentos é o pseudo glamour, refletido nas joias da personagem. A crítica de Fassbinder do pós-guerra está na figura da doutora Katz, cuja missão seria ajudar seus pacientes, mas que tem seus próprios propósitos. Essa é uma característica do diretor, inverter os papéis sociais.


Os personagens funcionam muito bem. Rosel Zech ganhou o prêmio de melhor atriz no festival de Munique. Anne Marie Düringer faz a fria e  manipuladora Dra. Marianne Katz. Cornelia Froboess é a companheira de Robert e que dá essência a sua Henriette e Armin Mueller-Stahl ator que aparece em poucas cenas, mas sempre em grande estilo. Para os cinéfilos, é mais lembrado por sua participação em “Senhores do Crime” ao lado de Viggo Mortensen.  


O Desespero de Veronika Voss foi o penúltimo filme do diretor, que morreria de overdose em 1982. Aqueles que curtem cinema diversão talvez não encontrem muitos atrativos neste filme, voltado aos que gostam de produções europeias mais densas e reflexivas do pós-guerra na Alemanha. Fora isso é uma produção com um ótimo roteiro, boa direção e excelentes atores.


Trailer (em alemão):






Curiosidades:

Rosel Zech (1942–2011)  faleceu aos 69 anos de câncer nos ossos

Annemarie Düringer (1925–2014)  faleceu no dia de seu aniversário, 26 de novembro, aos 89 anos

A Dra. Ursula Moritz, na qual o personagem da Dra. Marianne Katz se baseia, foi acusada de continuar a ofender a lei de drogas com a intenção de obter vantagem financeira ilegal. Henriette von Speidel, uma atriz de setenta anos, havia dado início a uma investigação legal. A idosa notara que nos últimos anos dois outros sublocatários do médico aparentemente haviam tirado a própria vida. Ela alugou um quarto na casa da Dra. Moritz e finalmente conseguiu apresentar as provas: 723 prescrições de narcóticos, feitas em um período de pouco menos de três anos. Paul Demmler, um funcionário do Departamento de Saúde de Munique que foi chamado para o caso, surpreendentemente defendeu a médica acusada, e o tribunal não conseguiu estabelecer uma prova legalmente vinculante de uma conexão entre a prática de prescrever os medicamentos e a morte de Schmitz. Os tabloides da época não aceitaram o veredicto (Moritz foi condenada a apenas quatro meses de prisão), e o público soube que a polícia e o Departamento de Saúde há meses se recusavam a investigar as acusações. O caso nunca foi satisfatoriamente resolvido, deixando espaço para especulações.

De acordo com Roger Ebert, "muitos críticos olham para Veronika Voss e se lembram de Gloria Swanson em "Sunset Boulevard", de Billy Wilder. diretor da cena (Volker Spengler) usa óculos e tem o chapéu empurrado para trás na cabeça, estilo Wilder."

Fassbinder tem uma participação especial no início do filme sentado atrás de Veronika Voss em um cinema e assistindo seu filme antigo.

Breve Filmografia:

Armin Mueller-Stahl :

 












Lola (1981); O Desespero de Veronika Voss (1992); Coronel Redl (1985); Divino Amadeus (1985); Uma Noite Sobre a Terra (1991); O Poder de um Jovem (1992); A Casa dos Espíritos (1993); Shine - Brilhante (1996); 12 Homens e uma Sentença  (1997);  Arquivo X: O Filme (1998); Jesus - A Maior História de Todos os Tempos (1999); Missão Marte (2000); Senhores do Crime (2007); Anjos e Demônios (2009); Cavaleiro de Copas (2015)

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