quinta-feira, 10 de setembro de 2015

TESE SOBRE UM HOMICÍDIO / TESIS SOBRE UN HOMICIDIO (2013) - ARGENTINA / ESPANHA


"A VERDADE PODE ASSUMIR VARIAS FORMAS, DEPENDENDO DE COMO SE OLHA PARA ELA "


Roberto Bermúdez  (Ricardo Darín) é um conceituado professor de direito, ministrando um curso de pós-graduação. Entre seus alunos encontra-se Gonzalo (Alberto Ammann de Cela 211), um jovem cujo pai foi um grande amigo de Roberto no passado. Ao se encontrarem em uma livraria, Gonzalo apresenta uma tese sui generis: o equívoco da sociedade moderna nos faria crer que a lei e a noção de justiça seriam estabelecidas por um grupo, cujo interesse seria manter-se no poder. Para exemplificar seu conceito explica que ele poderia pisar e esmagar borboletas e nenhuma punição lhe seria atribuída, porém se ele matasse uma espécie rara de valor inestimável, pertencente a uma coleção de um bilionário, ele poderia ser preso e completa: "o que se julga não é o ato em si. A lei não nos protege de uma agressão. A lei só intervém se o fato aberrante ameaça a estrutura do poder". Roberto não estende a conversa e segue seu caminho


À noite, na faculdade, um fato inusitado acontece: uma jovem aparece morta de forma brutal no pátio, ao lado da janela, onde Roberto leciona. O caso lhe atrai a atenção ao ponto de resolver investigar. Para sua surpresa, a jovem tinha em seu pescoço um cordão com um desenho de uma borboleta. O professor passa a desconfiar de seu novo amigo / aluno, à medida que este se mostra com uma personalidade que julga arrogante e excêntrica. Ao mesmo tempo conhece Laura, a irmã da jovem assassinada.




"Tese Sobre um Homicídio" é um filme argentino que se centra mais no desafio lançado pelo pupilo ao mestre. Será Roberto tão bom em desvendar mistérios na prática quanto é em expressá-los em teoria? Existe crime perfeito? Essas questões permearão o filme em que Roberto entrará em um processo obsessivo para pegar Gonzalo. Roberto acredita que todo crime tem um erro e que a análise dos detalhes é o diferencial. Gonzalo parece não ter deixado nenhum vestígio e possui o álibi perfeito: estava em sua sala de aula junto aos demais alunos. A hora do crime, por uma grande astúcia, não pode ser detectada, o que leva Roberto a crer que tudo fora planejado por uma mente brilhante. Mas seria Gonzalo realmente o assassino? Roberto acredita com todas as forças que sim. Gonzalo aparenta ser um jovem que, ao conhecer Roberto na infância, tomou-lhe como uma referência. Um ídolo, alguém a ser alcançado. Estaria Gonzalo testando seu mestre e descobrindo se este seria a única pessoa capaz de apanhá-lo ou há algo mais nessa história? .


A jovem Laura passa a ser uma espécie de peão em um jogo de xadrez que ninguém sabe ao certo como joga o adversário. Roberto que fazer justiça e vê em Laura uma oportunidade para lançar uma isca sem se importar (apesar de fingir se importar) com as consequências, pois sua obsessão o obriga a sacrificar o peão. Gonzalo cai na isca ou já sabe o movimento no tabuleiro do xadrez imaginário? Roberto descobre novas provas ou sua mente as está criando para que se encaixe em uma solução? Gonzalo se mostra um cidadão acima de qualquer suspeita. O professor quer capturá-lo, mas não quer divulgar suas suspeitas. O passado já lhe pregou uma peça, agora tem que ter certeza. Ou Roberto  deseja o crédito somente para si? Gonzalo não demonstra o perfil que Roberto julga ter percebido. A  ex-esposa de Roberto parece ser uma pessoa pouco interessada em ajudar, apesar de ter "know how" para essa tarefa. Ela já não mantém um relacionamento muito próximo a Roberto, a presença do professor é vista como uma invasão ao seu meio de vida.



"Tese sobre um Homicídio" é um ótimo filme, que deixa o espectador com a impressão de que Roberto talvez tenha razão em suas suspeitas, mas com uma pulga atrás da orelha. O suspense crescente é um dos pontos altos deste filme argentino que não economiza na didática de alguns assuntos, entrando no jargão jurídico e passeando por arte como a de Pablo Picasso (na cena da explicação de seu quadro na galeria do museu Malba). O espectador pouco acostumado a produções que demandam uma atenção mais seletiva poderá sentir-se confuso em determinados trechos, enquanto outros se sentirão à vontade. 
O elenco, sem dúvida, contribuiu de forma decisiva para o andamento da trama: Ricardo Darín (de "O Segredo de Seus Olhos" e "Relatos Selvagens") e Alberto Ammann mostram-se à vontade em seus papéis e “o confronto” nas telas surte o efeito desejado. Darín novamente é a força motriz desse filme e sua excelente atuação, como sempre, garante o interesse. Não por acaso, é um dos nomes mais citados quando se fala de grandes atores do momento. O restante do elenco representa com eficiência, apesar da trama estar mesmo centrada na dupla.




A direção de Hernán Goldfrid optou por fazer um jogo de gato e rato entre os personagens e leva o espectador a seguir o jogo psicológico, mas peca em aspecto muito importante: o final. Aqui se percebe que há muitas críticas acerca de um final mal explicado ou sem solução. Realmente. Parece que o diretor deixa para o espectador juntar o quebra cabeças e fazer sua própria conclusão do que seria. Pela ótica do diretor, o final está lá: quando os olhos de Roberto se abrem, ele soluciona o mistério. Agora caberá a cada espectador elaborar a sua tese sobre o homicídio, assunto para discussões após o filme. Produção inteligente, e caprichada na fotografia, com uma trilha sonora que passa despercebida, mas que contribui para aguçar os sentimentos nas cenas. Vale a pena assistir e tentar tirar suas próprias conclusões.








Trailer:







Filmografia Parcial:
Ricardo Darín:










Nove Rainhas (2000); O Segredo dos Seus Olhos (2009); Um Conto Chinês (2011); Elefante Branco (2012); Tese Sobre um Homicídio (2013); Sétimo (2013);  Relatos Selvagens (2014); Truman (2015).


QUANTO AO FINAL (SE NÃO ASSISTIU, NÃO LEIA)
Tese Para o homicídio foi feito para ter um final aberto, ambíguo, na qual espectador, ao final elaborará sua “Tese Para um Homicídio". Logo qualquer teoria soará como especulativa até que os envolvidos divulguem oficialmente o mistério. 

Abaixo alguns pontos importantes que observei no filme e que considero que seria interessante, a partir desses elementos, para cada um elaborar sua teoria. Por favor comentem e coloquem o seu final. Até porque os que leram o livro e colocaram informações na internet dizem que o livro é mais claro. Já o filme preferiu criar um mistério e fazer um final especulativo.

*Gonzalo diz a Roberto que “o homem é lobo do homem” (uma citação do romano Plautus e, posteriormente, por Thomas Hobbes).

* Gonzalo faz questão de citar a teoria da borboleta e a questão dos poderosos (o pingente que será encontrado com a vítima é uma borboleta!). Roberto diz que tem várias formas de contestar essa teoria. O desafio está lançado ?

* Roberto ganha um presente do pai de Gonzalo: uma espátula. 

* O corpo de uma jovem atacada e mutilada é encontrado no pátio da faculdade. Roberto e Gonzalo estão na sala de aula no momento e Roberto vê um pingente no pescoço da vítima quando se aproxima do corpo

- o formol aplicado na vítima impediu de determinar a hora do homicídio, o que pode significar que pode ter ocorrido antes (foi apenas para confundir a investigação?)

- o pingente não deixou marcas no pescoço da jovem, o que pode significar que pode ter desaparecido antes da autopsia ou o assassino o colocou após a morte da mesma

* Gonzalo fala a Roberto que seu pai seria seu nêmeses. Teria Gonzalo assumido o lugar do pai como um novo nêmeses ou apenas foi uma comentário?

* Gonzalo fala que seu pai quis fazer exame de DNA, então há uma suspeita da infidelidade da mãe (e o bilhete no local do crime tem uma frase: "morte a mulheres como ela"), logo há a suspeita de que o pai de Gonzalo não seja o verdadeiro pai - teria Gonzalo descoberto o resultado passando a acreditar seria Roberto o seu verdadeiro pai?

* A psicóloga nota semelhanças entre as jovens mortas (a argentina e a portuguesa) com a mãe de Gonzalo, na fotografia antiga do aniversário deste, mostrada por Roberto.

* A explicação do quadro de Picasso no museu Malba.

* A análise da psicóloga e ex-esposa que conhece Roberto há anos e lhe diz que este deseja que o mundo se acomode a ele, ou seja, ele é obsessivo e imagina coisas em uma lógica própria dele. E o inspetor cita que ele teria se enganado no caso "Latore” (Roberto estaria tendo um surto e imaginando pistas onde não há ?)

* Laura vai à casa de Roberto e questiona se este tem novidades. Depois vai direto na estante, onde se encontra o livro que Roberto lançara (coincidência?) e dera uma cópia à Gonzalo. Laura procura observar se ele está vendo sua ação. Ele dá o pingente a ela. Ela olha a foto de Gonzalo praticando boxe e, no dia seguinte, Gonzalo aparece exatamente onde ele treina dizendo que "não sabia que treinava boxe".

* Laura, que já conseguira o emprego da irmã, vai fazer dança aérea na qual a irmã tinha se matriculado (apenas seguindo os passos da irmã que tem saudades?);

* Roberto leva Gonzalo ao restaurante para que ele veja o pingente e expresse alguma reação, mas não nada acontece.

* No dia seguinte, ele vê Gonzalo e Laura conversando animadamente no restaurante e, à noite, saindo alegremente juntos. (se conheceram e se gostaram?)

* Roberto invade a casa de Gonzalo e vê que seu passaporte consta uma estadia em Portugal (onde houve uma vítima - não na mesma data - com o mesmo "modus operanti" do assassino). O que pode significar algumas coisas:

- O assassino reprisou na Argentina o homicídio.
- O assassinato foi copiado.
- ou seria para confundir Roberto (por que Gonzalo fez questão de se basear neste caso e a coincidência dos fatos em sua tese?)
- lembram-se do caso que Roberto conta do suicídio em que o assassino quis confundir os investigadores, uma indireta do professor para o aluno que parece não entender (ou não expressa sentimento)
- A médica fala para Roberto que seria factível aceitar que poderia haver perfis psicológicos similares entre os assassinos, mas que tudo pode ser fruto de sua imaginação


* O novo corte de cabelo de Laura a deixa parecida com a mãe de Gonzalo, mas, na verdade, o corte parece com o da irmã morta na qual passaram juntas o verão passado (vejam a foto que ela empresta a Roberto). Laura diz que a irmã tinha um namorado chamado Claudio (ela fala um nome, mas não sabemos se é verdade) e que esse namorado tinha outra namorada (seria Laura?). E Laura fala "Vale (a irmã Valeria) podia escolher quem quisesse. Foi uma estupidez”. Vale tentou tomar o namorado de Laura? (e o bilhete "morte a mulheres como ela" poderia ser de Laura se referindo à irmã?). Ou foi apenas um simples comentário que não a liga aos assassinatos?

*A moeda em pé, no interrogatório, seria uma deixa do tipo "sei que você está do outro do vidro" ou é (Gonzalo), o seu nêmeses, uma copia do mal, ou apenas o admira em seus principais aspectos?

* Roberto percebe que entraram em sua casa e deixaram um marcador de livros (da exposição de Picasso, o favorito de Gonzalo, no mesmo livro que Laura mexera). E agora no livro foi sublinhado "... a justiça mantém-se alheia esperando um novo caso" (como o inspetor revelara ter 186 casos para resolver). O dedo de Roberto está sobre uma palavra na qual as aparecem apenas iniciais Ma - é o museu Malba, famoso na Argentina, o marcador é de onde se “encontraram” Gonzalo e Roberto. E a espátula sumiu. (mas Roberto também recebeu um marcador na entrada do museu e pode ter colocado no livro, sublinhado-o e já não se lembra)

* Por que levar a espátula? Porque fora o presente mais recente que Roberto recebera (do pai de Gonzalo) e o mais fácil de acusar, na lembrança, a falta .

* Roberto vai à festa da dança aérea e vê Gonzalo com a espátula, que pode ter repassado à Laura. Ou Roberto viu o que desejava, influenciado por uma paranoia  progressiva?. Sua obsessão, aliada à falta de sono e cansaço, o traiu?

* Roberto (estranhamente) não lê a tese de Gonzalo.

* Quando Roberto abre os olhos teria percebido que, se a espátula não estava com Gonzalo, então foi Laura que a jogou na fornalha? (ou ele percebeu que tinha surtado e imaginado a espátula na fornalha?). A espátula agora queimando era a única prova concreta. O crime ficou sem prova? um crime perfeito?

Conjecturando:
O diretor atira muitas pistas para, posteriormente, desmentir algumas. Para montarmos esse quebra-cabeças temos que possuir ou uma atenção apuradíssima ou um controle remoto para dar "pause", voltando em cenas chaves.

Assim como Laura pode ter assassinado a irmã, com a ajuda de Gonzalo, este pode ter tentado destruir a carreira de Roberto (lembre-se que o inspetor disse que a briga influenciaria a carreira de Roberto) por este ter destruído a felicidade de seus pais e, consequentemente, a sua. Podemos ter um casal de psicopatas, onde Gonzalo pode não ter matado a portuguesa (a mídia se preocupa mais em publicar uma matéria do que acompanhar o seu desfecho), mas estudou, copiou e o adaptou ao seu interesse. Como era namorado de Laura e também de Vale, Laura convenceu Gonzalo a matar a irmã para ficarem juntos, na qual ela colocou o corpo no pátio e deu um álibi a Gonzalo. 

Agora podemos entender que tudo não passa de uma obsessão que Roberto criou para si (aliás o ponto de vista da estória parte sempre de Roberto) e que começou a associar e investigar (ele é advogado, não investigador) tudo que via (personagens, comportamentos, diálogos - tudo para ele se torna suspeito) no caso. Logo, o rapaz é realmente inocente e admirador dele, tentando impressionar seu ídolo. A jovem seria apenas alguém que perdeu brutalmente a irmã e Roberto, que já fizera um julgamento errado num caso chamado Latorre, não consegue aceitar que criou em sua mente uma estória maluca, paranoica, regada à muito álcool, noites sem dormir, e culpa por um fracasso anterior. Os detalhes que ele acredita serem a solução do caso, não passam de associações sem fundamento de sua mente perturbada e que estar errado novamente não poderia ser aceito. Após um longo sono, com o corpo e mente relaxados da tensão desses dias, a lucidez surge, por isso seu olhar? 

Qual a sua tese sobre este homicídio?

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