quarta-feira, 11 de setembro de 2019

O TRADUTOR / UN TRADUCTOR (2018) - CUBA / CANADÁ



FAZENDO A DIFERENÇA

1989. Cuba. Malin (Rodrigo Santoro) é professor de literatura russa na Universidade de Havana vivendo seu cotidiano ao lado da esposa, Isona (Yoandra Suarez), curadora de arte contemporânea e do filho pequeno Javi (Jorge Carlos Perez Herrera). Certo dia, ao chegar para ministrar aulas, descobre que ele e outros professores tiveram suas funções suspensas temporariamente em prol de se juntarem ao programa cubano de tratamento das vítimas do desastre de Chernobyl (1986). Suas funções: trabalharem como intérpretes entre as equipes médicas (que só falam espanhol) e pacientes ucranianos no hospital de Havana e dá-lhes o suporte necessário durante suas estadias.


Contra a própria vontade, Malin é designado a trabalhar na ala das crianças, percebendo de imediato que a maioria das que ali se encontram estão em estágio terminal sendo a chance de sobrevivência quase nula, restando apenas aguardar o falecimento das mesmas com o menor sofrimento possível.  Passando as noites no local, o relacionamento com a esposa começa a se deteriorar em meio a uma crise econômica que obriga todos a fazerem racionamentos, mas há outro problema: Isona revela estar novamente grávida.



Selecionado como pré-candidato ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, O Tradutor, produção cubana-canadense, tenta trazer às telas uma história pouco conhecida, apoiada na interpretação do brasileiro Rodrigo Santoro (Bicho de Sete Cabeças, Carandiru, 300 e do seriado Westworld). Se o espectador assistiu a ótima mini-série "Chernobyl" estará mais do que familiarizado com o terrível incidente que atingiu os reatores da cidade e o descaso do governo com o incidente. Ao contrário da minissérie que choca o espectador em vários momentos, mostrando os efeitos da radiação sobre corpos recém expostos, aqui a narrativa se passa 3 anos após os acontecimentos com a ajuda cubana a Rússia que, devido aos inúmeros casos de pessoas afetadas, recebeu assistência de Cuba para tratar em torno de 20.000 pacientes. Aqui a abordagem não visa chocar. Na verdade, aborda a vida de Malin e sua decisão de não ser apenas um simples tradutor no meio do caos. Aos poucos passa a se envolver com aquelas crianças e viver os seus dramas, chegando ao ponto de negligenciar a família.


Apesar da grande repercussão e da indicação é um filme que transita entre médio e bom. Dirigido pelos filhos de Manuel Barriuso Andino (o verdadeiro "Maulim"), Rodrigo e Sebastian Barriuso, o filme procura evitar o sentimentalismo e a mistificação do protagonista centrando em como sua vida deu uma guinada ao ser levado contra sua vontade (como diz a enfermeira; reclame com Fidel!) a trabalhar com crianças terminais em um momento e, posteriormente, se aprofundando nas breves vidas daqueles que lá se encontravam. Nesse panorama a dupla de cineastas, com o roteiro de Lindsay Gossling, pincela também o momento que o país sofria frente aos problemas russos: a falta de apoio econômico gerando escassez de comida, gasolina e o governo limitando saques de contas bancárias. Problemas do isolamento numa ótica anti-Fidel.


Rodrigo Santoro apresenta uma performance (como sempre) sólida. Seu Malin sai de um espectador dos fatos para um protagonista. O filme cresce quando Santoro e Maricel Álvarez (a enfermeira Gladys) estão em cena. Nesses momentos o espectador consegue captar a angústia dos personagens e Gladys percebe que o resistente professor passa a fazer muito mais do que fora designado e o frio ambiente que um hospital possui se transforma em um alento para crianças que esperam suas condições se tornarem insolúveis (a maioria adquiriu tumores e/ou leucemia). Uma dessas crianças, Alexi (Nikita Semenov), vive em isolamento devido ao seu sistema imunológico deficiente. Malin percebe o isolamento físico e psicológico daquela criança e tenta trazer alguma alegria em um momento tão desolador. 

 
Para se imergir melhor no drama, o conselho é assistir a película legendada (Santoro teve que aprender russo e espanhol) na qual o protagonista utiliza dois idiomas para se comunicar. Essa percepção, pelo espectador, de como as pessoas (pacientes e pais) ali reagem ao verem que existe alguém que fala as suas línguas nativas dá a noção exata da importância do sentimento de segurança. Não deve ter sido fácil para um brasileiro fazer um filme tendo de dividir-se entre dois idiomas não nativos (e tentando ter o sotaque) e sair-se bem, mesmo porque o filme deverá será visto nesses países. Santoro interagiu com o verdadeiro Manuel Barriuso e, muitas vezes, isso faz muita diferença, humanizando o personagem.


Filmado em Havana, O Tradutor é um bom filme: sólido, bem dirigido e muito bem interpretado em sua maioria. A opção por interpretar um personagem mais próximo da realidade, fugindo do estereótipo hollywoodiano de sempre criar personagens acima da linha média, funcionou muito bem. Para aqueles que curtem filmes menos comerciais e com uma temática mais voltada a informação e reflexão sobre pessoas que fazem a diferença.

Trailer





Cartaz:



Curiosidades:
A atriz Maricel Álvarez é argentina
No filme, Isona é o nome fictício de Magda González-Mora, mãe dos diretores. 


Premiações:
Seattle Latino Film Festival 2018 
Shanghai International Film Festival 2018
Trieste Festival of Latin-American Cinema 2018
International Film Festival of Panama (IFF Panama) 2019
Pune International Film Festival (PIFF) 2019


Filmografia Parcial: 

Rodrigo Santoro

 








O Trapalhão e a Luz Azul (1999); Bicho de Sete Cabeças (2000); Abril Despedaçado (2001); Carandiru (2003); As Panteras: Detonando (2003); Simplesmente Amor (2003); A Dona da História (2004); 300 (2006); Não Por Acaso (2007); Cinturão Vermelho (2008); Leonera (2008); Che 2: A Guerrilha (2008); Che: O Argentino (2008); O Golpista do Ano (2009); Recém-Formada (2009);Segredos da Paixão (2011); Heleno: O Príncipe Maldito (2011); Reis e Ratos (2012); O Que Esperar Quando Você Está Esperando (2012); O Último Desafio (2013); 300: A Ascensão do Império Xerxes  (2014); Golpe Duplo (2015); Os 33 (201); Em Busca da Justiça (2015); Pelé: O Nascimento de uma Lenda (2016); Ben-Hur (2016); Dominion (2016); O Tradutor (2018); Turma da Mônica: Laços (2019) 


Maricel Álvarez











Pequeños milagros (1997); Tierra de los Padres (2011); Dias de Vinil (2012); Un paraíso para los malditos (2013); Minha Amiga do Parque (2015); Vergel (2017); Toublanc (2017); O Tradutor (2018)


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