quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

PLAY / PLAY (2011) - SUÉCIA / FRANÇA





UMA VISÃO DA CULTURA DE UM OUTRO PAÍS

Play é uma coprodução Suécia / França de 2011, do diretor Ruben Östlund, que conta a história de três garotos (dois suecos e um asiático) que são abordados por cinco adolescentes, entre 12 e 14 anos, imigrantes e arruaceiros. Um dos adolescentes pergunta a hora para um dos garotos. Quando este olha o seu celular passam a seguir os garotos. Sebastian entra em uma loja de fast-food e informa à atendente que ele e seus amigos estão sendo seguidos por um grupo suspeito e pede que ligue para a polícia. A atendente minimiza o episodio e diz que a polícia tem assuntos mais importantes, orientando-o a ficar dentro da loja, pois o grupo não ousaria entrar no recinto. Só que um dos amigos, que estavam com Sebastian, entra na loja e diz que os adolescentes querem apenas conversar com os três. Sebastian sai da loja e, ao conversarem com o grupo, estes informam que um de seus irmãos foi assaltado e que o celular é idêntico. Eles intimidam os garotos a lhes acompanharem até o irmão para terem certeza de que não é o mesmo aparelho. Tudo começa a ficar suspeito quando o grupo começa a trocar o lugar de encontro, levando-os cada vez mais para longe. O grupo embarca em um trem e os adolescentes mexem com os passageiros. No meio do caminho o trem é invadido por um grupo de adultos que começa a bater no grupo por um celular roubado. O grupo foge e um dos adolescentes e um dos garotos ficam no vagão, enquanto o restante desaparece nos trilhos. Essa separação dá a chance de um dos garotos ligar para os pais a conselho de um dos jovens, mas nunca estão disponíveis.




 
 





Interessante filme independente que aborda um caso real acontecido no país entre 2006 e 2008 que teria aberto discussões na sociedade. O grupo teria feito 40 vítimas. Algumas passagens do filme são bem lentas, se comparadas ao cinema americano. O diretor optou por não fazer uma sequência linear dos fatos e inseriu na trama um pouco de humor com um carrinho de bebê esquecido no trem. De forma muito polida os agentes solicitam que o carrinho seja retirado do corredor para não atrapalhar a passagem dos demais. Em outra tomada resolvem levar o objeto para um depósito de achados e perdidos, mas retornam com o carrinho para o trem, pois não informaram em inglês, caso fosse de algum estrangeiro. Ademais, o diretor optou por alguns takes bem diferentes dos habituais, onde coloca uma imagem parada de um lugar e aos poucos as pessoas vão surgindo na tela ou passando em frente.





 
 





The Play, que por aqui passou no canal I-Sat, mostra com bastantes sutilezas alguns aspectos como medo, persuasão, discriminação, racismo, xenofobia, delinquência e complacência. Talvez o grande trunfo deste filme seja o fato do diretor ter criado sua própria produtora para que suas ideias pudessem sair do papel e transformarem em projetos, o que nem sempre acontece com diversos cineastas que estão começando e que terminam por desistir do projeto por falta de apoio. Outro aspecto é a possibilidade de se fazer uma produção sem a interferência de um grande estúdio, ditando custos e interferindo na obra (pois seu conceito fundamental é ter lucro, não incentivar novos cineastas). O diretor, já com certo prestígio no circuito europeu, revelou ter pesquisado em jornais, entrevistado vítimas e autoridades policiais para pegar os principais fatos e condensá-los em uma história. Percebe-se perfeitamente que os fatos podem não ter acontecido exatamente como narrado, mas a essência em si, resultou em um filme interessante em que o diretor evitou contar várias histórias e concentrou-se em apenas uma que se transformou em tema principal do filme.






 




Östlund tenta levantar a discussão, em uma sociedade que ele julga um tanto inocente. A cena em que um dos pais dos garotos localiza um dos jovens e tenta reaver o celular é bem exemplificada. Ao segurar o jovem, este grita para chamar a atenção até que uma mulher aparece e passa a acusar o homem de racismo e xenofobia. A diferença de pensamento é evidente: enquanto o homem informa que o menino é um ladrão, a mulher defende sua condição e diz que eles procedem assim porque a sociedade não lhes dá outra possibilidade. Essa discussão, para os suecos, foi tão forte que se arrastou conforme, informações da Internet, para a mídia onde vários setores se pronunciaram. Logo, o diretor viu uma possibilidade de exercer a sua visão onde o grupo de garotos, mesmo sabendo desde o início que estavam sendo enganados seguiu com os jovens por medo ou por uma inércia natural de uma sociedade que não sabe como confrontar essa situação. É muito interessante ver como a nossa sociedade lida com a violência constante e eles lidam com a violência esporádica.


 

Alguns aspectos interessantes mostram a diferença cultural da nossa sociedade:
Os garotos perdem todos os seus pertences, numa disputa injusta organizada pelos jovens , embarcando num trem de volta para casa sem dinheiro. O condutor anota seus nomes, endereços e lhes informa que seus pais receberão uma multa pelos correios por eles terem embarcado sem dinheiro ( os garotos ainda no estado de medo e vergonha não explicam a situação);
A omissão, como em nosso país, na forma da atendente que mostra simpatia, mas não quer se envolver e pedir ajuda da polícia, talvez por que não acreditasse que algo deste tipo ocorreria em seu país e que seria apenas uma desavença entre crianças.
A discussão entre a mulher que defende o jovem “indefeso” do pai do garoto, que quer o celular de volta, e esta lhe pede o nome e identificação para denunciá-lo às autoridades.





Play é uma produção que abre questionamentos (mais para os suecos) dos papéis desempenhados por cada um na sociedade. O diretor parece querer mostrar que sua sociedade parece não saber como lidar com esses tipos de assuntos e talvez seja ingênua demais para os tempos modernos no contato com outras culturas que se aproveitariam deles. Para quem procura filme europeu de qualidade é uma boa pedida.

 
 Trailer (legendado em inglês):



Curiosidades:

O elenco e o diretor:



O filme foi premiado em Cannes na categoria Séance "Coup de coeur"

2 comentários:

  1. Pessoal, quais os sentimentos de vocês a respeito de tal enredo? Os meus são conflitantes.
    Eu consigo imaginar o que se passa com as minorias, a falta de oportunidades, o preconceito que sofrem diuturnamente, mas ainda assim um sentimento de raiva me assola.
    A sensação é a de que aqueles meninos são a representação do que há tempos o inglês Thomas Hobbes disse: o homem é o lobo do próprio homem. E se é assim, se na essência somos ruins, num primeiro momento eu quero crer que não importa a condição social das pessoas, mas aí eu penso nas vítimas, a postura delas é diferente, o lobo que também há nelas mostra-se ali controlado (segundo o mesmo Hobbes, o papel do Estado é o de domar a fera - mas no caso poderia ser a família, a escola, apresentando valores que os homens convencionaram serem bons para uma vida sem conflitos). E ao pensar assim, eu volto ao ponto de início porque é possível que o lobo que há no âmago dos vilões não tenha sido controlado justamente por faltar-lhes as oportunidades que se acham à disposição do outro grupo de meninos.
    Enfim, estou a sofrer. Que filme forte e inquietante.
    É isso.

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    1. Boa tarde Isabel Aguiar.
      "Homo Homini Lupus", em latim, refere-se a frase "O homem é o lobo do homem", ou seja: "o homem é o inimigo do homem". Está na obra "Leviatã", do filósofo inglês Thomas Hobbes. O homem tem potencial para o bem e para o mal...Seu pensamento segue uma linha de raciocínio bem interessante. Vejamos os que assistiram pensam a respeito e aguardemos seus comentários. Não é um filme muito conhecido, o que é uma pena. Aconselho a ver também o filme "Infância Roubada", no original "Tsotsi" (já analisado por aqui), uma produção Sul Africana modesta, mas impactante que talvez se enquadre também nesse interessante tema que você levantou. Muito obrigado pelos comentários e volte sempre.

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