(O texto contém alguns spoliers)
Quatro de agosto de 1892,
Fall River, Massachussets. Andrew Borden (Fritz Weaver) e sua segunda esposa
são encontrados mortos a machadadas dentro de casa. As suspeitas recaem sobre
uma das filhas, Lizzie Borden (Montgomery), de 32 anos, que se encontrava na
casa enquanto a emprega Bridget Sullivan (Fionnula Flanagan) estaria do lado de
fora da casa limpando os vidros. A outra irmã, Emma (Katherine Helmond), estava
fora da cidade. Lizzie é incriminada e vai a julgamento. Enquanto ex-governador
do Estado, George Robinson (Don Porter) trabalha em sua defesa, alegando que o
tratamento administrado por um médico em Lizzie a impossibilita de demonstrar
emoções e coordenar as ideias nos depoimentos, o advogado de acusação Hosea
Knowlton (Ed Flanders) não tem a menor dúvida de que Lizzie é a responsável
pelo massacre.
A Lenda de Lizzie Borden é
um daqueles casos criminais nunca resolvidos e que mexem com o imaginário dos
americanos. Afinal, Lizzie teve realmente alguma participação na morte dos
pais? Teria o pai de Lizzie desavenças com outras pessoas? Lizzie teria feito
tudo sozinha ou teria tido ajuda? Por que foi absolvida por um júri popular?
Até que ponto a mídia e outros grupos interferiram no julgamento? Por que a
linha de investigação tinha apenas Lizzie como suspeita? O Telefilme tenta
trazer algumas respostas e aí pode ter sido o seu “Calcanhar de Aquiles”.
Dirigido por Paul Wendkos (1925-2009) de filmes como “A Irmandade do Sino” (1970); ”O Despertar de Candra” (83) e “O Sequestro do Voo 847: A História de Uli Derickson” (88); com o roteiro de William Bast (1931-2015): “A História de James Dean” (76) e “O Homem da Máscara de Ferro” (77), a produção se apresenta em tom semi-documental, mas é uma mistura de drama de época e suspense psicológico com uma conclusão em favor do espetáculo. Isso significa que os envolvidos resolveram criar uma solução para o caso. Especularam como Lizzie teria agido, deixando outros aspectos interessantes de fora como uma possível ajuda da irmã ou a participação direta da empregada (se olharmos bem há pequenas insinuações em frases ou cenas que contradizem o que é narrado).
Pelo que pude apurar desta
história, resumidamente, o patriarca da família Borden era um homem rico, proprietário de
estabelecimentos comerciais e casas que cobrava aluguéis e atuava em bancos e
instituições financeiras locais. Três anos após a morte da esposa, resolvera
casar novamente com Abby Durfee Gray (1865). Lizzie tinha cinco anos e Emma
quatorze. Em 1890 teria feito doações de diversas propriedades à família de
Abby, o que teria criado atrito com as filhas. A investigação cita que, na
véspera, John Vinnicum Morse (irmão da primeira esposa de Andrew – mãe das
meninas) esteve na casa e que houve desavenças quanto a questões financeiras.
Andrew era conhecido por ser mesquinho e avarento. O restante já sabemos: os
dois corpos foram encontrados e Lizzie foi a única investigada.
Aí entra o filme dando uma
versão que considera plausível, mas que levanta especulações: Na época de
roupas sofisticadas tendo blusas com botões na frente e atrás, mais o uso de
espartilhos (antigos – “vitorianos”) não eram muito fáceis de serem vestidos
por uma única pessoa. Conforme apurado, durante o julgamento, não houve nenhum
sangue encontrado em qualquer roupa de Lizzie (o filme dá uma explicação) ou em
seu cabelo e nenhuma pegada sangrenta, ou simples pegada foi encontrada perto
dos corpos das vítimas. Também o filme aborda de forma simplista a questão de
como ela seria capaz de remover o sangue de seu cabelo e como ela seria capaz
de se vestir rapidamente com meias, sapatos de botão alto, espartilho e saias e
vestido de duas peças sem a ajuda de sua empregada. E outro detalhe: não havia
água corrente interna (encanada), dificultando Lizzie lavar e secar rapidamente
seus longos cabelos e depois se vestir. Mas há pontos bem interessantes
mostrados: a narrativa da empregada, em oposição as lembranças de Lizzie;
possíveis abusos físicos e emocionais do pai; a pressão da nova esposa em
querer ser parte do testamento; o fato de, oportunamente, Emma estar fora da cidade;
uma investigação inicial mal feita ou praticamente inexistente, sem buscar
outros culpados; a pressão de entidades feministas; a opinião popular; as
testemunhas mal orientadas dando depoimentos controversos... Houve outros
filmes realizados que colocam Lizzie e Bridget como amantes e que o conflito
familiar advindo disso gerou os assassinatos. Difícil foi sustentar que alguém
cometeu os crimes sem deixar vestígios e pôs a culpa em Lizzie. Muito se diz
que a brutalidade dos crimes impediu os jurados da época em acreditar que uma mulher
seria capaz de tais atos, ou que sociopatas não eram ainda reconhecidos /estudados como
atualmente.
Quanto ao elenco, Elisabeth Montgomery tem um de seus melhores desempenhos: a mudança de seu semblante para ora frágil e ora ameaçadora / fria é um show à parte. Ela realmente convence no papel e nem parece a eterna Samantha do seriado “A Feiticeira” (lembrando que ela fazia o também papel da irmã Serena). Fritz Weaver (1926–2016), como Andrew, esta muito bem; assim como Ed Flanders como o advogado de acusação. Temos ainda Fionnula Flanagan como a empregada Bridget; Katherine Helmond como a irmã que tenta livrar Lizzie da prisão, mas que possui dúvidas. Há ainda a curiosa participação do ator Hayden Rorke (1910–1987),na cena da cela, que fazia o Dr. Bellows em “Jeannie é um Gênio” (série rival à “A Feiticeira”).
A Lenda de Lizzie Borden é
um filme que prende do início ao fim. É construído com flashbacks, completando a narrativa. Tem uma trilha muito boa, que evoca um clima quase
gótico; uma fotografia escura que causa proposital desconforto no espectador;
uma reconstituição de época excelente e atuações impecáveis. Estreou por aqui
na antiga "Sessão de Gala" em 05 de março de 1977, com ocasionais (e escassas)
reprises. Um filme a ser redescoberto.
Curiosidades:
Elizabeth Montgomery e Lizzie
Borden eram primas de sexto grau, ambas
descendentes de John Luther, morador de Massachusetts do século XVII. Rhonda
McClure, a genealogista que documentou a conexão Montgomery-Borden, disse:
"Eu me pergunto como Elizabeth se sentiria se soubesse que estava
interpretando sua própria prima".
Elizabeth Montgomery usou
colírios prescritos para fazer suas pupilas parecerem menores, para que
parecessem os olhos de Lizzie Borden após suas injeções de morfina.
Um dos vestidos usados por
Elizabeth Montgomery neste filme está em exibição na verdadeira casa de Borden,
que agora é um museu / pousada.
Lizzie herdou a propriedade
de seu pai e viveu em luxo e reclusão até sua morte em 1927, mas foi amplamente
considerada culpada e foi condenada ao ostracismo pela alta sociedade.
Outros filmes que retrataram
o mesmo assunto: "Lizzie" (2018), The Lizzie Borden Chronicles (2015
- Minissérie), A Arma de Lizzie Borden (2014)
Vencedor do Primetime Emmy
Awards para Melhor Edição e Melhor Figurino
Elizabeth Montgomery foi
indicada ao Emmy por sua atuação no filme
Elizabeth Montgomery
faleceu, aos 62 anos, devido a um câncer de intestino.
Ed Flanders cometeu suicídio
aos 60 anos.
Katherine Helmond faleceu em
decorrência de complicações do Alzheimer aso 89 anos.
Fritz Weaver faleceu aos 90
anos de causas não reveladas.
Hayden Rorke faleceu em 1987
de câncer aos 76 anos.
O filme está disponível no Youtube
Elisabeth Montgomery & Charles Bronson em um episódio de Além da Imaginação
(61)
Fritz Weaver no seriado Deep Space Nine
Ed Flanders em O Exorcista III
Fionnula Flanagan em Os Outros
Katherine Helmond
em "Brazil: O Filme"
Hayden Rorke no seriado A Feiticeira
Cartazes:
Filmografia Parcial:
Elisabeth Montgomery (1933–1995)
Seu Último Comando
(1955); Essa Loira Vale um Milhão
(1960); The Spiral Staircase (1961); O Mensageiro da Vingança (1963); Quem Anda Dormindo em Minha Cama? (1963);
Como Rechear um Biquini (1965); A Feiticeira (seriado 1964-1972); A Vítima
(1972); Sra Sundance (1974); Sedução (1974); The Legend of Lizzie Borden
(1975); Dark Victory (1976); Só o Amor Perdoa (1977); Jennifer: A
Woman's Story (1979); When the Circus Came to Town (1981); O Pesadelo de Sara Scott / Partes do Mistério (1983); Segunda Visão
(1984); Entre a Escuridão e o Amanhecer / Depois do Amanhecer (1985); Psicopata
(1991); Lutando Pela Justiça (1992); Os Crimes da Viúva Negra (1993); Um Corpo
de Rosto Familiar (1994) Deadline for Murder: From the Files of Edna Buchanan
(1995)
Ed Flanders (1934–1995)
Sede de Pecar (1970); A Lenda de Lizzie Borden (1975); Ataque ao Terror (1975); The Amazing Howard Hughes (1977); MacArthur, O General Rebelde (1977); A Fuga de D.B. Cooper (1981); St. Elsewhere (seriado 1982-1988); O Exorcista III (1990); Os Descasados (1995
Fionnula Flanagan
Alucinação de Ulisses
(1967); O Irresistível Bandoleiro (1969); O retrato de Dorian Gray (1973); A
Lenda de Lizzie Borden (1975); Pesadelo do acaso (1976); A Outra Face da Razão
(1980); Voyager from the Unknown (1982); Sonhos e Humilhações (1984); Caravana
da Coragem: Uma Aventura Ewok (1984); Veia de Campeão (1986); Noites de
Despertar (1992); Corredeira da Morte (1994); Mães em Luta (1996); Os Outros
(2001); Lágrimas do Sol (2003); Reencarnação (2004); Quatro Irmãos (2005); Sim
Senhor (2008); Irmandade (seriado 2006-2008); O Primeiro Mentiroso (2009); Os
Fantasmas de Scrooge (2009); Lost (seriado 2007-2010); O Mafioso (2011); Quando
os Anjos Cantam (2013); Defiance (seriado 2013); Pequeno Segredo (2016);
Predestinados (2018); Pequenas Mentiras Francesas (2019); Zone 414 (2021)
Katherine Helmond
(1929–2019)
Hospital (1971); A Lenda de Lizzie Borden (1975); A Família
que Ninguém Queria (1975); O Dirigível
Hindenburg (1975); A História de James Dean (1976); Trama Macabra (1976); O
Amor não Vai à Guerra (1976); Os Bandidos do Tempo (1981); Brazil: O Filme
(1985); O Espectro (1985); Um Salto para a Felicidade (1987); A Dama de Branco
(1988); A Organização (1992); Quem é o Chefe? (seriado 1984-1992); Nem Freud
Explica (1992); De Roma com Amor (1993); Espíritos de Natal (1997); Beethoven
5 (2003); Raymond e Companhia (seriado
1996-2004); Frank and Ava (2018)
Fritz Weaver (1926–2016)
O Poder e a Glória (1961);
Limite de Segurança (1964); Para Agarrar um Espião (1964); Caminhando Sob a
Chuva de Primavera (1970); O Dia do Golfinho (1973); A Lenda de Lizzie Borden
(1975); Maratona da Morte (1976); Domingo Negr (1977); Geração Proteus (1977);
Assassinato na Noite (1980); Creepshow: Arrepio do Medo (1982): A Empregada
Americana (1982); Terrorismo em Washington (1986); Meu nome é Bill Wilson
(1989); Cidadão Cohn (1992); Amor Cego (1993); Thomas Crown, a Arte do Crime
(1999); A Grande Luta de Muhammad Ali (2013); Nós Nunca Teremos Paris (2014);
Trocando os Pés (2014)
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