sábado, 29 de janeiro de 2022

A LENDA DE LIZZIE BORDEN / THE LEGEND OF LIZZIE BORDEN (1975) - ESTADOS UNIDOS

CRIME SEM SOLUÇÃO

(O texto contém alguns spoliers)

Quatro de agosto de 1892, Fall River, Massachussets. Andrew Borden (Fritz Weaver) e sua segunda esposa são encontrados mortos a machadadas dentro de casa. As suspeitas recaem sobre uma das filhas, Lizzie Borden (Montgomery), de 32 anos, que se encontrava na casa enquanto a emprega Bridget Sullivan (Fionnula Flanagan) estaria do lado de fora da casa limpando os vidros. A outra irmã, Emma (Katherine Helmond), estava fora da cidade. Lizzie é incriminada e vai a julgamento. Enquanto ex-governador do Estado, George Robinson (Don Porter) trabalha em sua defesa, alegando que o tratamento administrado por um médico em Lizzie a impossibilita de demonstrar emoções e coordenar as ideias nos depoimentos, o advogado de acusação Hosea Knowlton (Ed Flanders) não tem a menor dúvida de que Lizzie é a responsável pelo massacre.

A Lenda de Lizzie Borden é um daqueles casos criminais nunca resolvidos e que mexem com o imaginário dos americanos. Afinal, Lizzie teve realmente alguma participação na morte dos pais? Teria o pai de Lizzie desavenças com outras pessoas? Lizzie teria feito tudo sozinha ou teria tido ajuda? Por que foi absolvida por um júri popular? Até que ponto a mídia e outros grupos interferiram no julgamento? Por que a linha de investigação tinha apenas Lizzie como suspeita? O Telefilme tenta trazer algumas respostas e aí pode ter sido o seu “Calcanhar de Aquiles”.

Dirigido por Paul Wendkos (1925-2009) de filmes como “A Irmandade do Sino” (1970); ”O Despertar de Candra” (83) e “O Sequestro do Voo 847: A História de Uli Derickson” (88); com o roteiro de William Bast (1931-2015): “A História de James Dean” (76) e “O Homem da Máscara de Ferro” (77), a produção se apresenta em tom semi-documental, mas é uma mistura de drama de época e suspense psicológico com uma conclusão em favor do espetáculo. Isso significa que os envolvidos resolveram criar uma solução para o caso. Especularam como Lizzie teria agido, deixando outros aspectos interessantes de fora como uma possível ajuda da irmã ou a participação direta da empregada (se olharmos bem há pequenas insinuações em frases ou cenas que contradizem o que é narrado).

Pelo que pude apurar desta história, resumidamente, o patriarca da família Borden era um homem rico, proprietário de estabelecimentos comerciais e casas que cobrava aluguéis e atuava em bancos e instituições financeiras locais. Três anos após a morte da esposa, resolvera casar novamente com Abby Durfee Gray (1865). Lizzie tinha cinco anos e Emma quatorze. Em 1890 teria feito doações de diversas propriedades à família de Abby, o que teria criado atrito com as filhas. A investigação cita que, na véspera, John Vinnicum Morse (irmão da primeira esposa de Andrew – mãe das meninas) esteve na casa e que houve desavenças quanto a questões financeiras. Andrew era conhecido por ser mesquinho e avarento. O restante já sabemos: os dois corpos foram encontrados e Lizzie foi a única investigada.

Aí entra o filme dando uma versão que considera plausível, mas que levanta especulações: Na época de roupas sofisticadas tendo blusas com botões na frente e atrás, mais o uso de espartilhos (antigos – “vitorianos”) não eram muito fáceis de serem vestidos por uma única pessoa. Conforme apurado, durante o julgamento, não houve nenhum sangue encontrado em qualquer roupa de Lizzie (o filme dá uma explicação) ou em seu cabelo e nenhuma pegada sangrenta, ou simples pegada foi encontrada perto dos corpos das vítimas. Também o filme aborda de forma simplista a questão de como ela seria capaz de remover o sangue de seu cabelo e como ela seria capaz de se vestir rapidamente com meias, sapatos de botão alto, espartilho e saias e vestido de duas peças sem a ajuda de sua empregada. E outro detalhe: não havia água corrente interna (encanada), dificultando Lizzie lavar e secar rapidamente seus longos cabelos e depois se vestir. Mas há pontos bem interessantes mostrados: a narrativa da empregada, em oposição as lembranças de Lizzie; possíveis abusos físicos e emocionais do pai; a pressão da nova esposa em querer ser parte do testamento; o fato de, oportunamente, Emma estar fora da cidade; uma investigação inicial mal feita ou praticamente inexistente, sem buscar outros culpados; a pressão de entidades feministas; a opinião popular; as testemunhas mal orientadas dando depoimentos controversos... Houve outros filmes realizados que colocam Lizzie e Bridget como amantes e que o conflito familiar advindo disso gerou os assassinatos. Difícil foi sustentar que alguém cometeu os crimes sem deixar vestígios e pôs a culpa em Lizzie. Muito se diz que a brutalidade dos crimes impediu os jurados da época em acreditar que uma mulher seria capaz de tais atos, ou que sociopatas não eram ainda reconhecidos /estudados como atualmente.

Quanto ao elenco, Elisabeth Montgomery tem um de seus melhores desempenhos: a mudança de seu semblante para ora frágil e ora ameaçadora / fria é um show à parte. Ela realmente convence no papel e nem parece a eterna Samantha do seriado “A Feiticeira” (lembrando que ela fazia o também papel da irmã Serena). Fritz Weaver (1926–2016), como Andrew,  esta muito bem; assim como Ed Flanders como o advogado de acusação. Temos ainda Fionnula Flanagan como a empregada Bridget; Katherine Helmond como a irmã que tenta livrar Lizzie da prisão, mas que possui dúvidas. Há ainda a curiosa participação do ator Hayden Rorke (1910–1987),na cena da cela,  que fazia o Dr. Bellows em “Jeannie é um Gênio” (série rival à “A Feiticeira”).

A Lenda de Lizzie Borden é um filme que prende do início ao fim. É construído com flashbacks, completando a narrativa. Tem uma trilha muito boa, que evoca um clima quase gótico; uma fotografia escura que causa proposital desconforto no espectador; uma reconstituição de época excelente e atuações impecáveis. Estreou por aqui na antiga "Sessão de Gala" em 05 de março de 1977, com ocasionais (e escassas) reprises. Um filme a ser redescoberto.


Curiosidades:

Elizabeth Montgomery e Lizzie Borden eram primas de sexto grau,  ambas descendentes de John Luther, morador de Massachusetts do século XVII. Rhonda McClure, a genealogista que documentou a conexão Montgomery-Borden, disse: "Eu me pergunto como Elizabeth se sentiria se soubesse que estava interpretando sua própria prima".

Elizabeth Montgomery usou colírios prescritos para fazer suas pupilas parecerem menores, para que parecessem os olhos de Lizzie Borden após suas injeções de morfina.

Um dos vestidos usados ​​por Elizabeth Montgomery neste filme está em exibição na verdadeira casa de Borden, que agora é um museu / pousada.

Lizzie herdou a propriedade de seu pai e viveu em luxo e reclusão até sua morte em 1927, mas foi amplamente considerada culpada e foi condenada ao ostracismo pela alta sociedade.

Outros filmes que retrataram o mesmo assunto: "Lizzie" (2018), The Lizzie Borden Chronicles (2015 - Minissérie), A Arma de Lizzie Borden (2014)

Vencedor do Primetime Emmy Awards para Melhor Edição e Melhor Figurino

Elizabeth Montgomery foi indicada ao Emmy por sua atuação no filme

Elizabeth Montgomery faleceu, aos 62 anos, devido a um câncer de intestino.

Ed Flanders cometeu suicídio aos 60 anos.

Katherine Helmond faleceu em decorrência de complicações do Alzheimer aso 89 anos.

Fritz Weaver faleceu aos 90 anos de causas não reveladas.

Hayden Rorke faleceu em 1987 de câncer aos 76 anos.

O filme está disponível no Youtube


Elisabeth Montgomery & Charles Bronson em um episódio de Além da Imaginação (61)









Fritz Weaver no seriado Deep Space Nine








Ed Flanders em O Exorcista III








Fionnula Flanagan em Os Outros








Katherine Helmond  em "Brazil: O Filme"








Hayden Rorke no seriado A Feiticeira








 Cartazes:


















Filmografia Parcial:

Elisabeth Montgomery (1933–1995)






Seu Último Comando (1955);  Essa Loira Vale um Milhão (1960); The Spiral Staircase (1961); O Mensageiro da Vingança (1963);  Quem Anda Dormindo em Minha Cama? (1963); Como Rechear um Biquini (1965); A Feiticeira (seriado 1964-1972); A Vítima (1972); Sra Sundance (1974); Sedução (1974); The Legend of Lizzie Borden (1975); Dark Victory (1976);  Jennifer: A Woman's Story (1979); When the Circus Came to Town (1981); O Pesadelo de Sara Scott / Partes do Mistério (1983); Segunda Visão (1984); Entre a Escuridão e o Amanhecer / Depois do Amanhecer (1985); Psicopata (1991); Lutando Pela Justiça (1992); Os Crimes da Viúva Negra (1993); Um Corpo de Rosto Familiar (1994) Deadline for Murder: From the Files of Edna Buchanan (1995)


Ed Flanders (1934–1995)







Sede de Pecar (1970); A Lenda de Lizzie Borden (1975);  Ataque ao Terror (1975); The Amazing Howard Hughes (1977); MacArthur, O General Rebelde (1977); A Fuga de D.B. Cooper (1981); St. Elsewhere  (seriado 1982-1988); O Exorcista III (1990); Os Descasados (1995


Fionnula Flanagan






Alucinação de Ulisses (1967); O Irresistível Bandoleiro (1969); O retrato de Dorian Gray (1973); A Lenda de Lizzie Borden (1975); Pesadelo do acaso (1976); A Outra Face da Razão (1980); Voyager from the Unknown (1982); Sonhos e Humilhações (1984); Caravana da Coragem: Uma Aventura Ewok (1984); Veia de Campeão (1986); Noites de Despertar (1992); Corredeira da Morte (1994); Mães em Luta (1996); Os Outros (2001); Lágrimas do Sol (2003); Reencarnação (2004); Quatro Irmãos (2005); Sim Senhor (2008); Irmandade (seriado 2006-2008); O Primeiro Mentiroso (2009); Os Fantasmas de Scrooge (2009); Lost (seriado 2007-2010); O Mafioso (2011); Quando os Anjos Cantam (2013); Defiance (seriado 2013); Pequeno Segredo (2016); Predestinados (2018); Pequenas Mentiras Francesas (2019); Zone 414 (2021)

  

Katherine Helmond (1929–2019)






Hospital (1971);  A Lenda de Lizzie Borden (1975); A Família que Ninguém Queria  (1975); O Dirigível Hindenburg (1975); A História de James Dean (1976); Trama Macabra (1976); O Amor não Vai à Guerra (1976); Os Bandidos do Tempo (1981); Brazil: O Filme (1985); O Espectro (1985); Um Salto para a Felicidade (1987); A Dama de Branco (1988); A Organização (1992); Quem é o Chefe? (seriado 1984-1992); Nem Freud Explica (1992); De Roma com Amor (1993); Espíritos de Natal (1997); Beethoven 5  (2003); Raymond e Companhia (seriado 1996-2004); Frank and Ava (2018)

  

Fritz Weaver (1926–2016)







O Poder e a Glória (1961); Limite de Segurança (1964); Para Agarrar um Espião (1964); Caminhando Sob a Chuva de Primavera (1970); O Dia do Golfinho (1973); A Lenda de Lizzie Borden (1975); Maratona da Morte (1976); Domingo Negr (1977); Geração Proteus (1977); Assassinato na Noite (1980); Creepshow: Arrepio do Medo (1982): A Empregada Americana (1982); Terrorismo em Washington (1986); Meu nome é Bill Wilson (1989); Cidadão Cohn (1992); Amor Cego (1993); Thomas Crown, a Arte do Crime (1999); A Grande Luta de Muhammad Ali (2013); Nós Nunca Teremos Paris (2014); Trocando os Pés (2014)


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