“A DIVA DO GRITO“
Laureado
com 4 César da Academia Francesa, Margueritte é um filme de drama com generosas
pinceladas de humor refinado. O casal de atores Catherine Frot, André Marcon ("Depuração" e "Depois de Maio") são os grandes destaques desta obra que ainda traz o mordomo Madelbos, braço direito de
Margueritte, na pele do ator Denis Mpunga, que na maioria das cenas, apenas com olhares e poucas
falas, consegue uma presença cênica muito bem vinda. O filme é uma tragédia em
cinco atos. Para cada ato, como numa peça, temos um título e as ações que
decorrem desta tragicomédia.
O
filme, trabalhando por partes, nos apresenta Marguerite Dumont, uma mulher
riquíssima cuja paixão pela música, no caso erudita, nos idos de 1920, lhe leva a sonhar em ser
uma grande cantora de ópera. Ela se apresenta à plateias que lhe recebem sob
aplausos e gritos, após suas apresentações privadas, em sua luxuosa mansão.
Detalhe: Marguerite não consegue alcançar as notas e desafina horrivelmente o
que leva a todos a um misto de escárnio e repúdio. Mas seu poder econômico cria “adoradores”, que lhe enviam flores e a felicitam
entusiasticamente como se fora uma diva da música. E aí começam as
várias facetas que o filme mostra em sua projeção: falsidade, bajulação,
traição, ilusão, devoção, conspiração, amizade, piedade e sofrimento. Esses
ingredientes não são fáceis de serem inseridos em um filme de uma forma homogênea
e o diretor Xavier Giannoli mostra o quanto pessoas ricas e poderosas podem ser
completamente solitárias, com direito a falsos amigos,
trapaceiros e até um casamento por interesse.
A
ordem dos acontecimentos começa a mudar com a chegada de três personagens
igualmente interessantes: Hazel (Christa Théret), uma jovem com uma bela voz
que se apresenta na casa da rica anfitriã; o jornalista Lucien Beaumont
(Sylvain Dieuaide) e o artista / desenhista Kyrill Von Priest (Aubert Fenoy).
Os dois últimos se aproximam de Margueritte para conseguirem algum benefício,
mas são envolvidos pela poderosa e magnética personalidade da pretensa cantora.
É pelos olhos de Lucien que acompanhamos a vida da protagonista que se dedica a
cantar as árias mais difíceis do repertório clássico como "A Rainha da Noite" de "A Flauta Mágica" (Mozart) ou "Casta Diva" de “Norma” de Bellini, protegida por uma conspiração que a impede de
se ver como realmente é: uma cantora com uma voz irritante que se utiliza de
agudos estridentes, mas que ninguém tem coragem de lhe dizer como é absurdamente
ruim. Afinal o dinheiro fala mais alto. Mas como ela não consegue perceber que
canta tão mal? E ainda se acha uma soprano coloratura ? Deve ser a
pergunta de quem assiste ao filme.
Com
a entrada de Atos Pezzini (Michel Fau), um antigo cantor lírico e agora um
professor decadente, Marguerite vê seu sonho alcançar voos muitos mais
altos, ao ganhar um convite para uma apresentação pública, na Ópera Nacional de
Paris, para desespero de seu marido e alguns amigos próximos. Atos ainda leva
consigo sua trupe: um jovem, uma mulher barbada vidente e um pianista surdo que
interagem muito bem com a história dando um certo ar de non-sense.
Marguerite
consegue a façanha de tornar-se simpático até mesmo para aqueles que torcem o
nariz para música erudita. As árias são bem escolhidas, ainda que na voz
estridente de Marguerite, aonde o espectador reconhecerá algumas melodias famosas. A
escolha de "Il Pagliacci" como um momento mais longo foi uma atitude acertadíssima. E a apresentação final de Marguerite é, sem dúvida, o ponto mais alto do filme.
Outro
trunfo do filme foi trazer a história real da filha de banqueiro americana, Florence
Foster Jenkins (1868 – 1944), que se tornou conhecida na década de 40 e
transportar a história para a França de 1920, pós primeira guerra mundial,
utilizando o pseudônimo de Marguerite Dumont e adaptá-la ao contexto. A
reconstituição é excelente, a história envolvente e com ótimos atores. Ainda
que o filme pudesse terminar 10 minutos antes do que vemos na tela e congelar a
imagem em um momento sublime, o diretor optou por contar seu desfecho (não exatamente
como fora na vida real) de uma forma
correta, mas que quebrou um pouco a magia conseguida até então. A liberdade
autoral permite essas ousadias no cinema europeu.
Marguerite
é um filme de arte que deu o Oscar francês de melhor a atriz a Catherine Frot,
que interpreta (espetacularmente) uma milionária que vive em uma redoma
protegida principalmente por seu marido
e o seu fiel mordomo (e guardião). Todos querem uma parte de sua bondosa herança
e para isso fecham os olhos para a realidade que lhes confronta. Há quem tenha
visto uma crítica ao fascismo e nazismo que surgiriam décadas depois na forma
da Segunda Grande Guerra, onde muitos fecharam os seus olhos e abraçaram uma
causa que lhes favorecia, mesmo que o preço fosse omitir-se da verdade. A
sociedade mudou seus hábitos ou apenas o avanço tecnológico encobriu essas
mudanças?
Trailer legendado:
Curiosidades:
O diretor Stephen Frears lançou recentemente a mesma história, por um ponto de vista mais humorístico, no filme de produção inglesa Florence: Quem é Essa Mulher? (Florence Foster Jenkins), com os atores Meryl Streep e Hugh Grant
Soprano coloratura é um tipo de soprano que possuiu a voz mais aguda de todas e podem ser tanto dramáticas como os líricas. É uma característica das que reproduzem as passagens de registro mais complexas com extrema facilidade.
Poster do Filme:
Soprano coloratura é um tipo de soprano que possuiu a voz mais aguda de todas e podem ser tanto dramáticas como os líricas. É uma característica das que reproduzem as passagens de registro mais complexas com extrema facilidade.
Poster do Filme:
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