Neïla
Salah (Camélia Jordana), uma estudante de direito que, em seu primeiro dia na Universidade parisiense de Assas, chega atrasada 5 minutos na aula de Pierre Mazard
(Daniel Auteuil). O atraso gera uma discussão entre aluna e professor que viraliza e vai
parar na internet com alegações de racismo. Mazard recebe um ultimato do
diretor (o ator Nicolas Vaude) da instituição: para livrar a Universidade da acusação e evitar seu
desligamento por um conselho disciplinar deverá convencer Neïla a ter aulas
particulares de retórica e participar do concurso na qual a instituição não
vence há 4 anos. A direção não se interessa que ela vença, apenas que a aluna envolvida
na celeuma se junte ao professor acusado e passe uma impressão de que está tudo
bem. Sem saber desse acordo a jovem reluta, mas aceita participar das aulas de
eloquência e retórica. De acordo com que a dupla se conhece, Neïla
começa a se modificar e passa a observar um mundo bem diferente daquele que
imaginava conhecer.
O
Orgulho (Le Brio) poderia ser traduzido literalmente para "O Brio",
algo como “ter brio”, ter sentimento de orgulho próprio, honra, dignidade, algo
que Neïla começa a aprender aos poucos com aquele brilhante professor, mas
racista, irônico e sem papas na língua.
A descendente de argelinos, que vive com a mãe e avó nos subúrbios de Paris,
luta para vencer na vida, mas a segregação aos imigrantes nesse país pode ser vista sob uma
representação de Mazard e os que sofrem diariamente o preconceito, em Neila.
Ambos vivem sob o mesmo solo e cada um toca a sua vida, cada um demonstra pouco
interesse de se inteirar sobre o outro lado. Através de professor e aluna temos
um painel atual da sociedade francesa.
E
aí o filme cresce. Para Mazard, a aluna
se veste mal, fala errado e tem uma pronúncia que lhe incomoda. Sua visão da
justiça baseia-se no pensamento que o convencimento é mais importante do que a própria
justiça. É nos tribunais que as lutas se dão e quem souber melhor a arte do
convencimento logrará mais sucesso. A culpabilidade ou inocência (ou seja, a
verdade) são detalhes. Os advogados ganham suas causas ao serem excelentes
explanadores: terem um pensamento coerente, ao convencerem na argumentação e ao
exporem suas ideias de modo que façam sentido, mesmo quando essas ideias não
fazem. "A verdade não importa. É sobre estar certo." (o axioma preferido de Mazard). E o concurso de eloquência (o concurso, entre universidades, realmente existe) é um bom
teste para Neila entrar no hall dos grandes advogados ou ficar em um patamar
mais baixo. Para isso Mazard mostra pensamentos de Aristóteles, Nietzsche e de Schopenhauer
de onde se baseia a construção de sua estratégia para vencer o concurso: "38
Estratégias Para Vencer Qualquer Debate - A Arte de Ter Razão". O tempo é
curto, os concorrentes são preparados e a derrota em qualquer fase é
eliminatória. E aluna e professor possuem dificuldades de se entenderem.
Mazard, um adepto do método peripatético, implica com as roupas da jovem descendente de imigrantes. O Mundo trata melhor
quem se veste bem? Aquela propaganda brasileira antiga de jeans já nos falava
isso. Ter uma fala que não produza confusão é importante? Ler bons livros faz a
diferença? Ver o mundo por outros olhos é essencial ? romper com valores pré-estabelecidos e
abraçar a realidade em que vive é tão sem sentido assim? Essas proposições vão
surgindo aos poucos e Neila começa a perceber que está mudando, mais através
dos olhos dos outros do que dos seus. Seu namorado, Mounir, (um jovem motorista do Uber)
é uma prova disso. Ele vê a mudança em sua namorada e Neila não sabe exatamente
como interpretar ou lidar com isso. A mudança de paradigma pode ser confusa, mas
pode ser a revelação de um novo mundo, uma virada em uma vida destinada a um
caminho. Só que para chegar nesse caminho do respeito mútuo, as agressões
verbais mútuas entre a intempestiva jovem e o arrogante professor permearão a
narrativa.
O
diretor Yvan Attal teve um ótimo roteiro em mãos (alegou ser uma autobiografia
contada através de uma personagem feminina) e soube aproveitá-lo muito bem,
tendo em Camélia Jordana (uma elogiosa atuação da crítica e que recebeu o Cesar
de melhor promessa feminina) sua intérprete, mas não podemos deixar de citar que
Daniel Auteuil está igualmente excelente . As impressões e expressões de Mazard
captadas por Neila são também captadas pelo espectador que começa a ver um
homem por trás daquele que se apresenta (sempre há um outro ser humano por trás
das aparências) e isso é a grande qualidade do filme: nos mostrar que primeiras
impressões nem sempre são as que ficam e que muitas pessoas escondem seus
sentimentos por trás de uma carapaça por inúmeros motivos. Outro destaque fica
por conta do ator Yasin Houicha (como Mounir) que faz o namorado e motorista de Uber que em dado momento irá mostrar
que sua profissão não lhe priva de entender como o mundo é e
mostrar a Neila em que tipo de jogo ela realmente se encontra.
O
Orgulho é uma produção franco-belga bem acima da média: prende atenção desde o início e as excelentes
atuações do par central e seus mundos tão diferentes nos leva a acompanhar uma
história por vezes leve, outras reflexivas, com aquele humor refinado que o
cinema europeu volta e meia nos presenteia. É um filme que sucinta debates:
sobre nossa sociedade, sobre os dogmas que os seres humanos criam, seus
preconceitos, seus valores e a questão dos imigrantes tão em voga no panorama
mundial. Yvan Attal nos brinda com um roteiro que parece algo simples e que
evolui, gradualmente, para algo mais complexo, pois envolve o conceito do que é
a justiça no fim das contas. Tem uma narrativa dinâmica, sem atropelos e fácil
de ser acompanhada, com um final bem interessante, algo que muitos filmes
europeus tem certa dificuldade em acertar.
Trailer:
Curiosidades:
Música: Inner City Blues (Make Me Wanna Holler) - Marvin Gaye
Camélia Jordana também é cantora - Uma de suas músicas:
Camélia Jordana - Ce qui nous lie est là
O livro de Schopenhauer:
Cartaz do filme:
Filmografia Parcial:
Camélia Jordana
La stratégie de la poussette (2012); Bird People (2014); À Sua Completa Disposição (2015); Nós ou Nada em Paris (2015); Cherchez la femme (2015); O Orgulho (2018); Red Snake (2018); Curiosa (2018)
Daniel Auteuil
Monsieur Papa (1977); L'amour violé (1978); A Nós Dois (1979); A Banqueira (1980); Os incorrigíveis Saem de Férias (1982); Palace (1985); L'amour en douce (1985); Jean de Florette (1986); A Vingança de Manon (1986); Quelques jours avec moi (1988); Minha Estação Preferida (1993); A Rainha Margot (1994); A Separação (1994); Desejos Secretos (1995);O Oitavo Dia (1996); Os Ladrões (1996); A Garota Sobre a Ponte (1999); Sem Perdão (1999); O Acompanhante (1999); 36 (2004); Caché (2005); Contratado para Amar (2006); Conversas com Meu Jardineiro (2007); MR 73 - A Última Missão (2008); A Filha do Pai (2011); Atirador de Elite (2012); Antes do Inverno (2013); Entre Amigos (2015); As Confissões (2016); O Orgulho (2017); Amoureux de ma femme (2018)
Nicolas Vaude
A Rainha Margot (1994); O Pacto dos Lobos (2001); Viagem do Coração (2003); As Aventuras de Molière (2007); Conversas com Meu Jardineiro (2007); O Invencível - Largo Winch (2008); Coco Chanel & Igor Stravinsky (2009); Largo Winch II (2011); Cão Que Ladra Não Morde (2013); O Orgulho (2017); Méprises (2018)
A Rainha Margot (1994); O Pacto dos Lobos (2001); Viagem do Coração (2003); As Aventuras de Molière (2007); Conversas com Meu Jardineiro (2007); O Invencível - Largo Winch (2008); Coco Chanel & Igor Stravinsky (2009); Largo Winch II (2011); Cão Que Ladra Não Morde (2013); O Orgulho (2017); Méprises (2018)
Fontes:
IMDB
Jornal A Folha de São Paulo
Hollywood Reporter
Hollywood Reporter
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