segunda-feira, 8 de agosto de 2022

EU, CHRISTIANE F., 13 ANOS, DROGADA E PROSTITUÍDA / WIR KINDER VOM BAHNHOF ZOO (1981) - ALEMANHA

ATUAL E OPORTUNO

Christiane (Natja Brunkhorst) é uma jovem, como tantas outras, entrando na adolescência, na Berlim Ocidental dos anos 70. Vivendo em um conjunto habitacional decadente com a mãe (Christiane Lechle) recém-divorciada, passa os seus finais de semana na mais famosa discoteca da Europa, com sua melhor amiga Babsi (Christiane Reichelt): a “Sound”, conseguindo entrar mesmo sem ter a idade permitida. Certo dia, ao assistir um show do artista David Bowie, conhece Detlef (Thomas Haustein), um viciado em heroína e seu grupo de amigos, logo Christiane experimentará sua primeira droga e conhecerá o seu primeiro amor.

As drogas a levam a conhecer um novo mundo: um mundo de adolescentes desesperançosos e sem perspectivas de vida. De acordo com que sobe nas escalas de drogas, chegando à heroína, sua vida começa proporcionalmente a descer ladeira abaixo. Começa a furtar pequenos objetos em casa, mas a necessidade de satisfazer mais e mais a carência das drogas, começa à leva-la ao mundo da prostituição (na Berlin Zoologischer Garten Railway Station, uma importante estação ferroviária localizada na zona central) de forma gradual. Mesmo sendo levada a um tratamento, Christina sucumbe novamente às drogas, enquanto vai descobrindo que muitos de seus amigos estão perdendo suas batalhas frente ao vício.


Campeão de vendas na Alemanha desde o seu lançamento, “"Christiane F. - Wir Kinder vom Bahnhof Zoo"” (na tradução: “Christiane F. - Nós, Crianças (da estação) do Zoológico de Bahnhof”), se transformou  em um sucesso instantâneo, transformando Christiane F. em um ícone pop e símbolo da luta contra as drogas, vendendo milhões de cópias. Acabou indo para telas através do diretor Uli Edel em uma controversa adaptação: muitos acharam uma boa condensação do livro, outros viram a obra cinematográfica como apelativa, mas o impacto de Christiane F nas telas perdurou e ganhou projeção, assim como sua protagonista na vida real: Vera Christiane Felscherinow. O filme se passa durante os anos de 1975-1977, foi filmado em 1980 e lançado pela primeira vez em 1981. E Christiane participou como consultora do filme ainda que não tenha atuado.

O filme, lançado com o título (um tanto chamativo do livro) no Brasil (em 1983), “Eu, Christiane F, 13 anos, Drogada e Prostituída” e que vinha com o subtítulo brasileiro, “a imagem de uma geração”, teve problemas com a censura da época: o filme chegou a ser proibido no Brasil baseado no parecer do Conselho Federal de Entorpecentes. Os distribuidores recorreram ao Conselho Superior de Censura que, após vários pedidos, o liberou por maioria dos votos, sem unanimidade. Isso atrapalhou muito a divulgação por aqui, com críticas negativas e pouco tempo em grande circuito. E foi numa época com ótimos filmes sendo lançados e considerados pesos pesados nas bilheterias como: “A Escolha de Sofia”, “Gandhi”, “A Força do Destino”, “Tron”, “Vitor ou Vitória”...

Sexo, drogas e rock and roll eram considerados o trinômio maldito para os conservadores da década de 60 e 70. E os problemas da juventude alemã não eram tão distantes da juventude brasileira. Muitos consideraram que o relato em primeira pessoa, deu ao livro um impacto maior do que foi levado às telas, mas, a bem da verdade, o filme ajudou ainda mais ao livro atingir um público que não tinha o hábito de ler. Na Alemanha, o filme foi exibido em várias escolas, no Brasil também há relatos de jovens que tiveram contato com a obra em escolas de nível médio. E as filmagens não foram nada fáceis: eles não tinham permissão para filmar na estação, então o diretor de fotografia sentou-se em uma cadeira de rodas, escondeu a câmera no colo e foi empurrado pelo diretor. Em outra cena, a atriz que fez a protagonista, estava sendo filmada de longe na calçada quando um carro parou para que ela entrasse. A equipe entrou em pânico: não fazia parte da filmagem e a atriz quase acabou entrando dentro do carro do desconhecido que tentou abordá-la. Quando o filme finalmente foi às telas o rosto que as pessoas associaram a Christiane foi o de Natja Brunkhorst. Décadas depois ainda a abordavam acreditando ser a jovem do livro. Conforme dito pela produção, muitos figurantes e artistas de fundo que aparecem nas cenas do Sound Club e da Estação Ferroviária eram jovens da vida real, viciados em drogas e prostitutas que foram encontrados para as sequências envolvendo multidões. A dublagem foi muito criticada nos Estados Unidos. Os americanos assistiram uma dublagem inglesa por sobre o original alemão e, acredito, que esse seja o motivo da dublagem brasileira ser estranha em alguns momentos: o material fornecido já era ruim. Prefira a versão legendada.

O filme, apesar de não ser tão chocante quanto o livro, logra êxito ao descortinar mais uma das mazelas dessa nossa desvairada sociedade: o vício em drogas e a deprimente condição na qual esses jovens passam a se submeter para adquiri-las. Há alguns pontos confusos e mal explorados como o papel da mãe (que no filme se torna omissa), a ausência do fornecedor de drogas (apenas em uma cena) e o aparente vínculo das drogas essencialmente ao rock. Já o livro deixa transparecer que o problemas das drogas são mais complicados do que muitos desejam levar a crer: carência afetiva; amargura; ressentimento dos pais; lares desfeitos; desagregação familiar; pais que inconscientemente transmitem ao filhos o seu desespero e solidão; uma sociedade que impõe um ritmo vertiginoso em cima das pessoas que trabalham sem tempo para se dedicar aos filhos, pois o custo de vida também impõe severas perdas; incompreensão dos pais e educadores; as insuportáveis tensões que os centro urbanos impõem sobre as pessoas (a família de Christiane havia se mudado do campo para a cidade); lugares cada vez menores e pouco espaço para as crianças brincarem. O fato de Christiane levar uma vida dupla, durante tanto tempo, sem que seus pais percebam, é um exemplo desse distanciamento.

Originalmente, a história de Christiane foi publicada em forma de série de 12 partes pela revista alemã de notícias "Stern" com o depoimento de F aos jornalistas Kai Hermann e Horst Rieck. Com o sucesso mundial, a jovem se declarou livre do vício em drogas, mas em 1983 acabou sendo presa novamente enquanto comprava heroína no apartamento de um traficante. Em 2016, juntamente à escritora Sonja Vokovic, escreveu o livro “Christiane F. - A Vida Apesar de Tudo”, no qual detalha os acontecimentos posteriores àqueles contados no primeiro livro, incluindo o retorno às drogas, a vida como mãe e o trabalho que faz na recuperação de outros dependentes químicos.

Christiane F é um dos retratos mais sombrios do vício em drogas já filmados, sendo baseado em fatos sobre a verdadeira cultura de drogas da juventude de Berlim da década de 1970. Por ter sido filmado com jovens sem experiência sem atuação, mostra-se cru e impactante com cenas fortes. Temos a rápida presença de David Bowie que forneceu a alavancada na divulgação que o filme precisava. Um filme para os jovens ganharem percepção e para os adultos despertarem para a dura realidade das drogas.


Curiosidades:

Nos Estados Unidos o livro recebeu o nome de "Christiane F: Autobiography of a Girl of the Streets and Heroin Addict".

Vera Felscherinow nasceu, em 20 de maio de 1962, na cidade de Hamburgo. Nessa época um muro dividia a Alemanha, fazendo com que o país vivesse um eterno clima de tensão por uma possível guerra com os Estados Unidos.

O filme contou com a música de David Bowie, que até apareceu no filme em sequências de shows. Seu envolvimento com o filme ajudou sua conscientização e bilheteria. Quase todas as músicas da trilha sonora do filme foram escritas ou co-escritas por Bowie. De acordo com o livro fonte do filme, Christiane F. na vida real teve sua primeira experiência com heroína em um show de Bowie e este fato foi reiterado como um elemento da história do filme.

Uma das melhores amigas de Christiane F. no filme é Babsi (interpretada por Christiane Reichelt), que mais tarde chegou à capa do jornal "Berliner Zeit" em 1977, quando morreu com apenas quatorze anos. Babsi foi a mais jovem vítima de drogas em Berlim, e sua morte, juntamente com a publicação do livro "Wir Kinder vom Bahnhof Zoo" ajudou a aumentar a conscientização sobre o aumento do número de usuários de drogas adolescentes.

Thomas Haustein, que interpreta Detlef no filme, conheceu a verdadeira Christiane F. e sua amiga Stella (interpretada por Kerstin Richter no filme) no set quando eles vieram visitar durante as filmagens. Thomas e Stella na vida real estavam namorando por um tempo durante a produção do filme, e ela também está no filme, brevemente. Ela interpreta o traficante de drogas que vende heroína Detlef no Sound Disco Club, perto do início. Ela está vestindo um casaco comprido. Stella morreu em 2004 devido a complicações de saúde, consequência de anos de abuso de álcool e drogas.

O significado da Estação do Zoológico de Berlim no livro de origem e no subtítulo e na história do filme é que foi o local que foi um ponto final para muitos adolescentes alemães que morreram lá de overdose de drogas em seus banheiros e cubículos miseráveis.

O filme é baseado em fatos sobre a verdadeira cultura de drogas da juventude de Berlim da década de 1970. 

A sequência do show estrelado por David Bowie foi filmada em Nova York em outubro de 1980 no Hurray Club. Como Bowie aparecia na Broadway várias noites por semana na época, o diretor Uli Edel teve que filmar as cenas naquela cidade. O local foi decorado de forma a se assemelhar a uma boate de Berlim. As grandes cenas da multidão do show utilizaram imagens de um show do AC/DC na então Alemanha Ocidental.

Muitos dos atores do filme estavam na escola, nunca haviam atuado antes e eram atores de primeira viagem. Para a maioria, este foi seu único crédito em filmes e TV e não trabalhou na indústria cinematográfica desde então.

O papel de estreia no cinema da atriz Natja Brunckhorst, que tinha apenas 14 anos quando o filme foi filmado. Embora este filme tenha sido controverso, Brunckhorst voltou atrás com isso, seu próximo filme foi Querelle (1982), dirigido pelo controverso diretor alemão Rainer Werner Fassbinder.

O filme foi feito e lançado cerca de dois anos depois que seu livro fonte "Christiane F: Autobiography of a Girl of the Streets and Heroin Addict" foi publicado pela primeira vez em 1979.

O subtítulo do filme "Wir Kinder vom Bahnhof Zoo" se traduz literalmente em inglês como "Nós, crianças do zoológico de Bahnhof" ou "Nós, crianças da estação do zoológico".

A verdadeira Christiane F. saiu da estreia no meio da exibição porque se sentiu envergonhada ao ver os eventos de sua antiga vida se desenrolarem na tela e porque queria evitar perguntas da imprensa.

Primeiro longa-metragem dirigido por Uli Edel.

Thomas Haustein estava um pouco nervoso em filmar cenas de sexo neste filme. "Eu não estava envolvido no mundo gay e é claro que eu estava nervoso para representar algo assim na frente de uma câmera. Isso também foi o mesmo com minha primeira cena de sexo com Natja. Eu não tinha tido nenhuma experiência sexual ainda! Então, antes da cena com meu cliente masculino, Uli me pegou sozinho sem a equipe, só eu e ele, e ele ficou atrás de mim para demonstrar como deveria ser." - diz ele, rindo.

Originalmente, o filme seria dirigido por Roland Klick, mas depois de uma longa preparação, ele foi demitido apenas duas semanas antes das filmagens, após uma briga com o produtor Bernd Eichinger. Depois disso, Uli Edel entrou para dirigir o filme.

Christiane Lechle, a atriz que interpretou a mãe de Christiane, foi dublada por Renate Küster.

Ao atirar em um banheiro público sem permissão, Uli Edel acidentalmente encontrou um grande saco de heroína que estava escondido lá. Edel queria vender a heroína para financiar os dias de cinema. Enquanto ele tentava convencer o produtor Bernd Eichinger, um viciado de aparência perigosa entrou, parecendo que ia atacar Natja Brunckhorst. Edel rapidamente jogou a sacola nele e o viciado se virou e fugiu, para nunca mais ser visto.

A atriz que interpreta a personagem principal tinha 14 anos quando filmou sua cena de nudez


Trilha Sonora:

V2 Schneider - David Bowie

TVC15 - David Bowie

Station to Station - David Bowie

Heroes/Helden - David Bowie /Brian Eno 

Stay - David Bowie

Sense of Doubt - David Bowie

Boys Keep Swinging - David Bowie /Brian Eno 

Warszawa - David Bowie /Brian Eno


Passado e Presente - Christiane F









Passado e Presente - Natja Brunckhorst










Cartazes:



Filmografia Parcial:

Natja Brunckhorst







Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída (1981);  Querelle (1982); Die Spitzen der Gesellschaft (1990); Babylon - Im Bett mit dem Teufel (1992); Virus X - Der Atem des Todes (1997); A Princesa e o Guerreiro (2000); Totem (2011) 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Olá Cinéfilos.
Obrigado por visitarem minha página.
Estejam à vontade para comentarem, tirarem dúvidas ou sugerirem análises.
Os comentários sofrem análises prévias para evitar spans. Tão logo sejam identificados, publicarei. Quaisquer dúvidas, verifiquem a Política de Conduta do blog.
Sua opinião e comentários são o termômetro do meu trabalho. Não esqueça de informar o seu nome para que possa responder.
Visitem a minha página homônima no Facebook onde coloco muitas curiosidades sobre cinema , séries e quadrinhos (se puderem curtir ajudaria). Comentários que tragam e-mails e telefones não serão postados
Bem-vindos.
Cinéfilos Para Sempre