UM FILME MAIS CENTRADO NO SER
HUMANO
Filmes de Samuel Fuller, como o provocador anti-racista Cão Branco e a loucura da guerra em Agonia e Glória, são, a princípio, vistos com certa simplicidade, mas bastam alguns minutos, após os créditos finais, para que percebamos a complexidade na ambientação e em seus personagens.
Anjo
Mau (um título não tão bom para Pickup on South Street) é um filme tipicamente
noir: em preto e branco, de cunho
policial, anti-heróis, corruptos, cínicos, mulheres de índoles duvidosas,
realismo urbano, aquele ar de paranoia, além da famosa fotografia facilmente
reconhecível. Aqui todos esses elementos são colocados ao longo da trama de uma
forma bem crua e direta, bem ao estilo do diretor que sempre evitou
"florir" seus personagens com longas e entediantes falas.
O
filme começa com o batedor de carteiras Skip McCoy (o ótimo ator Richard
Widmark) roubando uma bolsa no metrô de uma mulher chamada Candy (a bela Jean
Peters). Ela vinha sendo seguida por agentes à procura de um objeto que estava
em sua bolsa. Ao informar ao seu companheiro Joey do roubo, Candy percebe que
carregava algo de muita importância e
que se envolvera em um jogo perigoso. Enquanto Joey a incube de localizar o
larápio no submundo, o capitão Dan Tiger, responsável pela prisão de Skip por
três vezes, recebe a visita de um agente, que lhe informa que dentro da bolsa
existia um filme contendo segredos militares a serem vendidos a países
inimigos. Dan Tiger consegue, com a ajuda de Moe (Thelma Ritter indicada ao
Oscar como atriz coadjuvante), a localização de Skip. Ao capturá-lo, o mesmo
finge desconhecer a acusação e se nega a informar o paradeiro do filme, até porque
uma quarta condenação o levaria a prisão perpétua.
Nesse
subestimado filme vemos o quanto a paranoia pós-guerra ainda agitava o
imaginário coletivo. Os inimigos, ou traidores da pátria são referidos como
vermelhos, uma alusão à ameaça comunista na guerra fria que perdurou por anos.
Os
personagens principais não possuem boa índole ou passado nobre. Skip:
hipócrita, irônico e sarcástico, solto da cadeia após ser preso pela terceira
vez é desprovido de qualquer patriotismo e indiferente aos danos que o material
em suas mãos pode ocasionar. Seu interesse é apenas o proveito financeiro. Seu
ar de cafajeste encanta Candy, que posa de mulher fatal, com um passado ligado,
provavelmente, a prostituição e vivência no submundo, presa a Joey numa relação
que se subentende seja por uma dívida ou obrigação. O capitão Dan Tiger (Murvyn Vye) é
conhecido como um policial durão, mas que recorre a estratégias pouco éticas,
tanto para conseguir informações, como na acusação de Skip. Os agentes que
vigiam Skip parecem trafegar, em determinados momentos, nos dois lados: vão
buscá-lo para um interrogatório, mas não recusam uma cerveja oferecida por ele.
Os
diálogos são curtos e diretos. Na maioria das vezes ríspidos. Surge uma tensão
emotiva entre a dupla principal, mas para Skip, o mundo é um passatempo de
dinheiro e mulheres. Candy parece ter encontrado alguém que gosta, mas não
percebe os sentimentos de Skip. Joey (Richard Kiley) é o personagem covarde e inseguro, mas que
com uma arma na mão, como dizia a música de Bezerra da Silva, “é um bicho feroz”
(ou talvez nem tanto).
A personagem de Moe, interpretada magnificamente
pela atriz Thelma Ritter, simboliza a América dos esquecidos, sem oportunidades
ou esperanças. Suas frases são ditas como um reflexo de parte da população que
garante sua sobrevivência, em meio a um sistema econômico apenas bonito para
alguns. Tudo que Moe quer é ter um local onde morrer e não ser enterrada em uma
vala comum. Seu desejo é o reflexo de muitos na época, que não tinham condições
de se adequar ao sistema socioeconômico, passando a criar suas próprias
filosofias de vida.
Quanto
ao ritmo do filme, sim, existem alguns momentos em que o filme reduz seus
passos, tornando-o mais lento, mas a trama, interessante, consegue manter-se da
primeira até a última cena, muito em parte ao carisma do trio Widmark, Peters e
Ritter.
Um
bom filme noir, bem diferente daqueles que se costuma a assistir, visto que o
estilo de direção de Fuller é único. Talvez não seja tão impactante como
“Agonia e Glória” que quase toda a hora nos traz algo de desconcertante,
mostrando a irrealidade com um tom de plausibilidade que incomoda ou Cão Branco, uma viagem pela mente de pessoas que transformam um animal em racista
(novamente o surreal carregado, infelizmente, da certeza da capacidade do ser
humano de odiar). Anjo Mau pode não ser o melhor de Fuller, mas dentro de sua
filmografia não fez feio e quem gosta de filmes em que se exploram mais o ser
humano do que situações, possivelmente o verá como um filme com conteúdo.
Trailer:
Filmografia Parcial:
Richard Widmark (1914- 2008)
O Beijo da Morte (1947); Pânico nas Ruas (1950); Anjo do Mal (1953); O Álamo (1960); Julgamento em Nuremberg (1961); Os Legendários Vikings (1964); Crepúsculo de Uma Raça (1964); Assassinato no Expresso Oriente (1974); O Último Brilho do Crepúsculo (1977); Terror na Montanha Russa (1977); Paixões Violentas (1984); A Um Passo do Poder (1991).
Trailer:
Filmografia Parcial:
Richard Widmark (1914- 2008)
O Beijo da Morte (1947); Pânico nas Ruas (1950); Anjo do Mal (1953); O Álamo (1960); Julgamento em Nuremberg (1961); Os Legendários Vikings (1964); Crepúsculo de Uma Raça (1964); Assassinato no Expresso Oriente (1974); O Último Brilho do Crepúsculo (1977); Terror na Montanha Russa (1977); Paixões Violentas (1984); A Um Passo do Poder (1991).
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Olá Cinéfilos.
Obrigado por visitarem minha página.
Estejam à vontade para comentarem, tirarem dúvidas ou sugerirem análises.
Os comentários sofrem análises prévias para evitar spans. Tão logo sejam identificados, publicarei. Quaisquer dúvidas, verifiquem a Política de Conduta do blog.
Sua opinião e comentários são o termômetro do meu trabalho. Não esqueça de informar o seu nome para que possa responder.
Visitem a minha página homônima no Facebook onde coloco muitas curiosidades sobre cinema , séries e quadrinhos (se puderem curtir ajudaria). Comentários que tragam e-mails e telefones não serão postados
Bem-vindos.
Cinéfilos Para Sempre