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sexta-feira, 12 de junho de 2020

A VASTIDÃO DA NOITE / THE VAST OF THE NIGHT (2019) - ESTADOS UNIDOS



"EXISTEM DUAS POSSIBILIDADES... OU ESTAMOS SOZINHOS NO UNIVERSO OU NÃO ESTAMOS. AMBAS SÃO IGUALMENTE ATERRORIZANTES”   (ARTHUR C. CLARKE)

Na década de 50, na cidade (fictícia) de Cayuga, Novo México, Everett (Jake Horowitz) é um nerd que supervisiona o equipamento de gravação da escola e trabalha na rádio local noturna.  Fay (McCormick) é amiga de Everett e trabalha na central telefônica. É o dia do jogo de basquete local e a população se diverte indo ao evento que ocorre no ginásio da escola. Ao receber uma estranha ligação, com um som eletrônico complexo, que continuamente atrapalha as comunicações, Fay pede a Everett ajuda no esclarecimento do mistério. O jovem, intrigado, resolve colocar o som durante seu programa lançando uma promoção para quem desvendar. Logo surge um homem que começa a narrar uma história fantástica de como trabalhara para o governo em um projeto secreto e o que significaria tal som. Everett e Fay resovem sair às ruas e investigar o evento após a jovem receber ligações de habitantes narrando terem visto algo nos céus. Quando vão à casa de uma senhora que diz saber o que está acontecendo sua revelação assusta o casal.


Ao navegar pela internet vi um site falando sobre o filme que vinha ganhando fãs entusiasmados e fui dar uma olhada nessa produção que vem com o selo da Amazon Prime (a melhor concorrente da Netflix). The Vast of Night é uma produção independente que foi rejeitada em diversos festivais conceituados como:  Sundance Film Festival;  Cannes International Critics Week; Hollywood Reel Independent Film Festival, Gold Coast Film Festival, Hong Kong International Film Festival... quase duas dezenas de festivais de prestígio. Mas o filme também conseguiu participar de outros festivais como: Film Independent Spirit Awards 2020; Americana Film Fest 2020; Montréal Festival of New Cinema 2019; Philadelphia Film Festival 2019; Slamdance Film Festival 2019; Toronto International Film Festival 2019 onde conseguiu nomeações e premiações



Realizado em 2016 em apenas 17 dias, sua estreia ocorreu no Slamdance Film Festival em janeiro de 2019 e, a partir daí, chamou a atenção fazendo com que a Amazon o lançasse em sua plataforma.  Mas o que esperar dessa produção independente de baixíssimo custo (não divulgado) que tem erros e acertos?  A verdade é que o filme não agradará a todos  os públicos, visto que sua principal característica é se apoiar em uma  narrativa (diálogos) bem inteligentes, com boas atuações centrada no ponto de vista de Fay, a telefonista, que é o ponto incial de todo o mistério.  



O filme se inicia com uma série de TV chamada “Paradox Theatre” (uma evidente analogia ao famoso seriado sessentista “Além da Imaginação” ) nos remetendo das imagens dos anos 50, em preto e branco, para a realidade colorida dos jovens dos anos 50.  Após um longo diálogo inicial entre os protagonistas, com direito a especulações sobre os 50  anos seguintes, onde o avanço da tecnologia mudaria toda a visão da sociedade, nosso casal inicia seus turnos noturnos. Quando Everett começa a conversar com um ouvinte descobre estar envolvido em algo que jamais poderia imaginar: segredos de Estado, experiências secretas, ocultação de informações e até Óvnis  (a palavra não é mencionada, nem os termos que usamos atualmente). E assim começa a "odisseia" do casal em busca de solucionar o mistério que parece também se apresentar aos olhos de alguns habitantes.  O leitor deve estar pensando no incidente em m Roswell, sim, a comparação é inevitável, ainda que não haja menção ao fato.  Há uma abordagem sobre o racismo (no ouvinte que alega que foi recrutado por sua cor) e até sexismo (na senhora entrevistada que narra um acontecimento que valida a história do tal ouvinte). Essas narrativas prendem o espectador? Sim, os diálogos são inteligentes e a forma como nos apresenta é bem convidativa, com muita tensão e expectativa. Há uma cena muito criativa em que a câmera percorre a cidade, entra no ginásio e muda diversas vezes o seu posicionamento, talvez o melhor momento do filme. Há efeitos? Sim, próximo do final, onde  vemos na qual foi aplicada a maioria dos recursos do filme. A filmagem (na verdade no Texas) ,transcorrendo durante uma noite, foi uma escolha bem acertada..


A Vastidão da Noite é um filme direcionado a quem gosta de ver o que os novos cineastas estão produzindo. Esse filme é a mais pura interpretação do conceito: “uma ideia e uma câmera na mão”.  É um grande filme? Não. Ao final da produção muitos dirão “é só isso?” e, infelizmente, de certa forma é. Um filme que mostra que mesmo sem recursos, quando há um roteiro inteligente pode-se produzir algo de diferente. Talvez o grande atrativo dessa obra seja mostrar que cinema não são apenas efeitos de última geração, grandes atores ou explosões e tiros. Quando há criatividade e força de vontade e comprometimento podem surgir surpresas. E Vastidão da Noite pode te surpreender.


Trailer:




Curiosidades
As letras de chamada da estação de rádio "WOTW" são uma homenagem a "Guerra dos Mundos"

A mítica cidade Cayuga é emprestada da Cayuga Productions, a empresa de produção de Rod Serling que produziu Além da Imaginação

O nome do personagem Renny é uma referência ao ator Michael Rennie, que interpretou o alien Klaatu em "O Dia em que a Terra Parou" (1951).


Filmografia Parcial:
Sierra McCormick









O Elo Perdido (2009); Ramona e Beezus (2010); Uma Babá para o Natal (2010); Christmas in the Heartland (2018); A Vastidão da Noite (2019); VFW (2019); Exploited (2020)

Jake Horowitz









Murt Ramirez Wants to Kick My Ass (2012); A Midsummer Night's Dream (2014); A Vastidão da Noite (2019); Adam Bloom (2020); Castle Freak (2020)

quarta-feira, 10 de junho de 2020

O CHALÉ / THE LODGE (2019) - REINO UNIDO / CANADÁ / ESTADOS UNIDOS


PROVOCATIVO E INTRIGANTE

Richard (Richard Armitage) resolve se separar de sua esposa Laura (Alicia Silverstone) e lhe comunica que em breve se casará com sua namorada Grace (Riley Keough).  A situação causa inesperadas consequências que obrigam Aidan (Jaeden Martell) e Mia (Lia McHugh) a morarem com o pai.  Como o casal de filhos não aceita Grace e ainda a responsabiliza pela dissolvição da família, Richard ,que precisa voltar ao seu trabalho, convence o trio a passar alguns dias juntos em um Chalé em meio as montanhas geladas e assim se conhecerem melhor.  Só que o adolescente  Aidan  investiga o passado de Grace e descobre que ela, aos doze anos, estivera diretamente envolvida com culto religioso, cujo  pai era o líder e ela a fora única sobrevivente do episódio. Richard fora o jornalista que escrevera o artigo para um jornal. Grace não consegue interagir com as crianças, esconde de Richard que faz uso de medicação e começa a ter sensações estranhas sobre o local enquanto Aidan e Mia acreditam que foram deixados sozinhos com uma psicopata.  




The Lodge (ainda sem título no Brasil – talvez o mais a apropriado fosse “O Chalé") não teve seu orçamento divulgado, mas teve uma bilheteria mundial baixa, em torno de 2 milhões de dólares.  O filme estreou no Festival de Sundance em janeiro de 2019, um festival que apoia filmes independentes, logo os orçamentos são normalmente baixos, bem longe das cifras de filmes Hollywoodianos. E a produção é de três países: Reino Unido, Canadá (onde ocorreram as filmagens ) e Estados Unidos.  O filme recebeu críticas desfavoráveis da mídia especializada, mas entre o público vem colhendo elogios. Não por acaso: é um filme que abre discussões para vários temas e nos entrega um belo terror psicológico que não vem mastigado. O espectador tem que prestar atenção aos detalhes que compõe a história e assim entender como as situações apresentadas puderam levar a um final bem interessante.



Talvez um dos maiores problemas de The Lodge seja o mesmo que vem ocorrendo com algumas produções do gênero nos últimos anos: se vender como algo extraordinário em sua divulgação com frases tipo: “o melhor terror dos últimos anos” e etc. Já vimos o que isso causou em filmes como Hereditário e A Bruxa que se venderam como os novos “O Exorcista”.  Quando este tipo de publicidade é utilizado pelos distribuidores cria-se uma grande expectativa e a inevitável responsabilidade de cumprí-la. O ideal é uma produção ser lançada com outras formas menos agressivas de divulgação e deixar o público e o tempo dar o aval que a produção mereça. The Lodge é um filme bem intencionado, bem realizado e dirigido. Se ganhará o status de cult ou “um filme interessante” fica a cargo do tempo, o melhor dos juízes.


A premissa do filme pode não ser muito atraente, mas a forma inteligente como desenvolveram este argumento sim.  Talvez uma das chaves do filme seja nos levar a um lugar surpreendentemente sombrio e irremediavelmente triste, em que seu aspecto mais assustador é nos revelar como tudo isso é bem humano. E o desenvolvimento dos personagens é algo bem interessante:  Richard (do bom seriado “Não Fale com Estranhos”) não é uma pessoa boa: ele está trocando a esposa por uma mulher mais nova e diz friamente que irá se casar pouco se importando com os sentimentos de Laura (Alicia Silverstone, em breve, mas impactante participação)  e as consequências do que possa ocorrer a ex-esposa. Ele não é um bom pai porque literalmente larga seus filhos com uma pessoa com um passado sombrio da qual conhece muito bem sobre o culto e a participação de Grace (Riley Keough – a neta mais velha de Elvis Presley) nos eventos e, ao mesmo tempo, parece não se importar muito com Grace sabendo que seus filhos a odeiam, mal a conhecem e que terá conviver durante alguns dias sendo imprevisível o que possa ocorrer dessa equivocada interação.  Laura é uma personagem que aparece rápido, mas abre muitas discussões sobre os caminhos sombrios que a depressão leva a algumas pessoas. Grace é uma incógnita. Foi dito ( site IMDB)  que seu personagem baseia-se no caso Heaven’s Gate (1997) de suicídio coletivo. Sabemos de um fragmento de seu passado, pouco sabemos de seu presente e não temos assim como antever suas ações futuras, mas podemos conjecturar. Crianças são imprevisíveis e suas criatividades imensas, logo essa união de personalidades já seria algo bem interessante de explorar nas telas, mas junte-se a isso tragédias, dogmas religiosos, estigmas, um lugar desolado, ódio, indiferença, ressentimentos, solidão ....  um barril de pólvora.  A dupla Veronika Franz e Severin Fiala (a dupla austríaca que fez “Goodnight Mommy” em 2015) criou uma atmosfera que nos leva a crer que sabemos para onde o filme se encaminha e isso é um engano (contar ou explicar o filme estraga toda a experiência – o final será explicado no fim da filmografia dos atores): o roteiro planta uma gama de dúvidas, possibilidades e potenciais reviravoltas antes de se decidir pela mais devastadora de todas.




Há interessantes inspirações e referências: a casa de bonecas é tida como uma referência a Hereditário ( 2018 ) e o lugar desolado e coberto, de densa neve, que prende o trio a uma infeliz coincidência,  lembra o clássico O Iluminado. Na tevê passam os filmes o Enigma do Outro Mundo  (1982) , Uma Noite Mágica (1998) e Grito de Pavor (1961). Interessante também é percebermos que as produtoras são a famosa inglesa Hammer dos filmes de horror dos anos 60 (seu auge) até os anos 80 e retornando em 2007 e a americana FilmNation responsável por produções como A Estrada (2009);  A Pele que Habito (2011);  Fome de Poder (2016); A Chegada (2016);  O Irlandês (2019).




The Lodge logra sucesso em implementar uma mistura de vários ingredientes, no intuito de obter um efeito estranho e perturbador. Tem uma narrativa linear e coesa, onde tenta levar o espectador para vários caminhos entregando uma solução que talvez não agrade a todos, mas que sem dúvida é bem criativa. O ritmo cadenciado é perfeitamente adaptável à história onde não há tentativas de fazer o espectador pular da cadeira ou se horrorizar. Na verdade busca trazer a este aquela curiosidade de tentar descobrir o que se passa. Um jogo para adivinharmos quem está realmente jogando.

Trailer:



Curiosidades

O nome do cachorro é Grady, que é o nome do personagem do cuidador do Overlook Hotel na história de "The Shining", de Stephen King.

O líder do culto Aaron Marshall, pai de Grace Marshall, é interpretado pelo pai da atriz Riley Keough, Danny Keough.

A pintura de Maria vista na cena de abertura e ao longo do filme é uma reprodução de L'Annunciata (Virgem Anunciada) pelo artista renascentista italiano Antonello da Messina (1430-1479).

Filmografia Parcial

Richard Armitage 










Robin Hood (seriado 2006 a 2009); Capitão América: O Primeiro Vingador (2011); Strike Back  (seriado 2010 a 2011); O Hobbit: Uma Jornada Inesperada (2012); O Hobbit: A Desolação de Smaug (2013); No Olho do Tornado (2014); O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos (2014); Hannibal (seriado 2015);  Alice Através do Espelho (2016); Brain on Fire (2016); Sonâmbula (2017); A Peregrinação (2017); Oito Mulheres e um Segredo (2018); The Lodge (2019); Operação Berlim (seriado 2016 a 2019); Não Fale com Estranhos (seriado 2020)

Riley Keough










The Runaways: Garotas do Rock (2010); Paixão Obsessiva (2011); Jack & Diane (2012); O Beijo do Vampiro (2012); Mad Max: Estrada da Fúria (2015); Docinho da América (2016); À Beira do Abismo (2017); Ao Cair da Noite (2017); Logan Lucky: Roubo em Família (2017); A Casa que Jack Construiu (2018); Noite de Lobos (2018); The Lodge (2019); Pássaro do Oriente (2019); Zola (2020); The Devil All the Time (2020)

Alicia Silverstone










Paixão sem Limite (1993); Traição Fatal (1994); O Esconderijo (1995); As Patricinhas de Beverly Hills (1995); Batman & Robin (1997); De Volta para o Presente (1999); Quebrando Todas as Regras (2002); Miss Match (seriado 2003);  Um Salão do Barulho (2005); Vítima da Sedução (2005); Trovão Tropical (2008); A Arte da Conquista (2011); Butter: Deslizando na Trapaça (2011); Amigas Inseparáveis (2013); King Cobra (2016); Um Cachorro Para Dois (2016); Diário de um Banana: Caindo na Estrada (2017); O Sacrifício do Cervo Sagrado (2017); Do Jeito que Elas Querem (2018); American Woman (seriado 2018); The Lodge (2019); Bad Therapy (2020); Masters of the Universe: Revelation (desenho - voz - 2020)

Jaeden Martell










Um Santo Vizinho (2014); Deixa Rolar (2014); Sob o Mesmo Céu (2015); Destino Especial (2016); O Livro de Henry (2017); It: A Coisa (2017); The Lodge (2019); It: Capítulo Dois (2019); Entre Facas e Segredos (2019); Em Defesa de Jacob (Mini-série 2020)

Lia McHugh










Hot Summer Nights (2017); Totem (2017); Totem (2017); American Woman (seriado 2018); The Lodge (2019); Os Eternos (2021


Explicação sobre o final 

O plano das crianças começa ao mostrarem a Grace um vídeo que dariam para o pai com os melhores momentos que passaram juntos quando sua mãe ainda estava viva (uma indicação de que não queriam Grace ali). Aindan insiste em ligar o aquecedor a gás mesmo com Grace reclamando que o cheiro estava forte. Eles dão um chá “batizado” para Grace que dorme durante muito tempo. Ao acordar ela descobre que vários objetos, pertences e comidas da casa desapareceram misteriosamente (na verdade eles esconderam no porão), sem nenhuma explicação e as crianças alegam não ter mexido em nada. E o pior: o remédio que Grace tomava escondido para manter sua sanidade também desaparecera assim como seu cachorrinho. Grace tenta sair da casa em busca de auxílio e encontra caído na neve, perto da casa, um quadro com a foto de Aidan e Mia escrito  "In Loving memory" (como se fosse deixado por alguém há tempos ). Aindan vê a foto e conclui que eles morreram por causa do vazamento do gás e se encontram num limbo (ou purgatório) e seu principal argumento é que ninguém sabe como é a morte afinal (lembram do diálogo entre Richard e a filha em que ele lhe diz "ninguém sabe para onde vamos" com Aindan escutando na porta?). Ainda encontram uma página de jornal mostrando um obituário do trio o que comprova sua teoria. Aindan "se enforca" para mostrar que realmente não estão mais no mundo dos vivos e que precisam se arrepender. Grace pela falta do remédio e o stress começa a ouvir vozes, principalmente de seu falecido pai. Sua insanidade vem à tona. Ela inicia um autoflagelo como forma de purificação ao andar ajoelhada na neve ou se ajoelhar em brasas. Aindan e Mia, que planejaram tudo, se dão conta que foram longe demais no plano de fazer Grace confessar que destruíra uma família, dando lugar a constatação que estão presos com uma mulher que um dia participou de um culto de mortes em massa e que seu estado por ter revertido ao da época, além de que soltaram o cachorrinho sem querer e o animal morrera congelado. Eles revelam tudo, mas Gace em seu frágil estado mental não mais acredita entendendo que precisa realizar um sacrifício para ascender aos céus. Quando Richard não consegue mais falar com Mia (acabara a bateria e não conseguiram mais religar a luz) e vê a casa de bonecas resolve ir ao chalé. Ao chegar ao local, vê Grace com um revolver na mão (que ele mostrara a ela no início do filme) e acaba sendo alvejado por ela. O filme termina com as crianças na mesa com Grace e, no tambor 2 balas, e a fita adesiva escrita Sin (Pecado) como em seu culto. Um final aberto, mas quase óbvio. Vocês concordam ? Deixem seus comentários

sábado, 28 de março de 2020

O CULTO / THE ENDLESS (2017) - ESTADOS UNIDOS


IDIOSSINCRASIAS SOMBRIAS
(o texto contém alguns spoilers)


"A mais velha e a mais forte emoção da raça humana é o medo, o mais velho e forte tipo de medo é o medo do desconhecido " H.P Lovecraft

Justin (Benson) e seu irmão mais novo Aaron (Moorhead) vivem presos a um cotidiano angustiante: possuem um emprego em que são mal remunerados, não possuem amigos, nem namoradas. A dupla frequenta semanalmente um psicólogo que tenta algum tipo de ajuda, mas o atrito entre os irmãos não diminui. Justin e Aaron perderam a mãe em um acidente, foram criados por uma comunidade chamada "Acampamento Arcádia" que segundo denuncias de Aaron cometeria suicídio coletivo, inclusive com castrações dos adultos.  Ele conseguiu fugir e levou seu irmão mais novo, denunciando o fato na imprensa como o “culto da morte UFO”, mas Aaron só consegue se lembrar de uma vida idílica, com comida saudável, brincadeiras e uma comunidade acolhedora. A situação começa a mudar quando Aaron recebe uma fita pelos Correios que mostra que a comunidade não cometeu nenhum assassinato coletivo e que todos parecem estar muito bem, inclusive na aparência, pois já se passaram mais de uma década do acontecido.



Justin, diante da frustração do irmão e a vontade deste de regressar à comunidade nas colinas da California, para rever velhos amigos, resolve acompanhar Aaron. Quando chegam ao local são bem recebidos e perdoados, principalmente Justin, por ter “disseminado mentiras” que criaram repulsa à comunidade. Os irmãos percebem que o local sobrevive através da venda de cerveja artesanal e trabalhos artísticos de seus integrantes. O que era para ser apenas uma noite de visita tornam-se dias com Aaron desejando permanecer definitivamente no local. Enquanto isso Justin percebe, no grupo e em seu líder (Tate Ellington), certo ar de descontentamento com a sua presença, ao mesmo tempo em que alguns fenômenos parecem ocorrer no local demostrando estarem em grande perigo.



O Culto (The Endless – algo como “O Infinito”) abre com uma citação do autor de terror cult H.P. Lovecraft e colheu críticas favoráveis da mídia especializada e público por ser um filme de ficção-científica independente, modesto, que prende pela ótima performance dos protagonistas e as reviravoltas que vão surgindo ao longo da estória. O filme é uma continuação de “Restoration” (2013), mas não se necessita assistir ao primeiro filme para compreender os fatos que aqui ocorrem. A dupla de diretores, que também atua como protagonistas e construtores da estória (Benson), foram estagiários na companhia do cineasta Ridley Scott (Aliens) e mostraram que aprenderam muito bem como desenvolver um filme que prende do início ao fim.


Enquanto tenta abordar o relacionamento de irmãos, a necessidade de se sentir pertencente e a questão de “perder a sua liberdade, mas se sentir feliz ou ter liberdade, mas não conseguir concretizar a vida sonhada”, os diretores inserem alguns elementos que fazem tudo fluir a contento: fenômenos inexplicáveis; uma estranha seita; um ritual noturno bizarro;física quântica, uma equação matemática obscura; looping temporal; uma possível entidade; uma maldição daqueles que ali se estabelecem e o que os membros da seita esperam: o que eles chamam de ascensão.


Há momentos muito curiosos que vão se explicando aos poucos: o ritual da corda gigante que se estende para um breu; a mulher que procura o marido; o homem enforcado; o minerador do século XIX que morre repetidamente em segundos em um angustiante ciclo; as duas luas, o estranho comportamento dos pássaros; pequenas esferas geográficas gerando distorções espaciais e temporais (um dos motivos dos jovens poderem se deslocar esteja no fato de que ainda não foram fixados em uma); uma presença opressiva e invisível... talvez tudo seja apenas confrontar o passado e abraçar o desconhecido, mas qual o preço a se pagar?


O Infinito é ficção científica, metafísico, disfarçado de drama cotidiano que fala sobre uma possível entidade que mexe com a estrutura do tempo / espaço a conduzir uma sombria sinfonia apocalíptica ao usar membros da comunidade como instrumentos para consecução dos seus objetivos. É um filme que segundo os cineastas dará todas as respostas, bastando uma apurada observação, que faz pensar e é direcionado aqueles que gostam de produções que espalham várias peças para depois o espectador juntar o quebra-cabeças. Um filme acima da média quando vemos como foi produzido e o valor investidos pelos envolvidos.

Trailer:



Curiosidades:
Os cineastas usam a música "House of the Rising Sun" por toda parte porque as letras são de domínio público, o que os ajudou a permanecer dentro do seu orçamento limitado.

O primeiro filme de gênero a ser exibido na Competição dos EUA no Festival de Cinema de Tribeca desde "Deixa Ela Entrar" (2008).

A decisão de Justin Benson e Aaron Moorhead também atuarem no filme foi em grande parte uma tentativa de manter o orçamento baixo

Na sala onde a equação matemática está no quadro-negro, há um globo no canto que mostra o sudeste da Ásia e a Austrália. Mas eles não são mostrados na configuração da geografia atual porque a Austrália no mundo está conectada à Papua Nova Guiné e à Tasmânia, o que aconteceu pela última vez há mais de 12.000 anos.



Filmografia:
Aaron Moorhead










Resolution (2012);  Contracted: Phase II (2015); O Culto (2017); I Blame Society (2020)

Justin Benson











Contracted: Phase II (2015);  Dementia (2015); O Culto (2017); After Midnight (2019); Nurse Hollings

Callie Hernandez









Machete Mata (2013); Sin City: A Dama Fatal (2014); ILa La Land: Cantando Estações (2016); Bruxa de Blair (2016); O Culto (2017); Alien: Covenant (2017);Graves (seriado 2016 a 2017); Under the Silver Lake (2018); Soundtrack (seriado 2019); One of These Days (2020)

Tate Ellington









The Elephant King (2006); Rastros de Vingança (2008); O Retorno de Um Herói (2009); O Primeiro Mentiroso (2009); Lembranças (2010); Straight Outta Compton: A História do N.W.A. (2015); A Entidade 2 (2015); Quantico (seriado 2015 a 2016); O Culto (2017); Wanderland (2018); A Patient Man (2019); Tone-Deaf (2019)


quinta-feira, 24 de maio de 2018

O NOCAUTE DE JERRY / THE HAMMER (2007) - ESTADOS UNIDOS



DIREÇÃO E ATUAÇÕES INSPIRADAS

No dia em que completa 40 anos, Jerry Ferro (Adam Carolla) briga com seu chefe sendo despedido do emprego de carpinteiro. Ao chegar em casa e comunicar o fato à namorada é largado por esta que o considera uma pessoa sem iniciativa e que poderia estar em um emprego muito melhor,  ganhando consideravelmente mais. Jerry fica na casa do seu amigo Oz (que fora despedido com ele) até que surge a oportunidade de trabalhar em uma academia boxe de um amigo. Ao fazer um treinamento, Jerry atrai a atenção de um agenciador que pede que "lute" com um lutador profissional que também estava no local treinando (um momento hilário). Ao nocautear, facilmente o jovem lutador, recebe um convite para tentar se classificar nas prévias de seleção para as olimpíadas de 2008, visto que fora um antigo vencedor, ainda jovem, nas "luvas de ouro". 
Jerry, que também dá aulas de ginástica, conhece Lindsay, uma aluna, e a convida para sair. Enquanto o casal se conhece melhor, Jerry se prepara para o torneio que poderá levá-lo  às Olimpíadas, apesar de ser questionado pelos outros jovens atletas quanto a sua idade e possibilidades. Só que o agenciador talvez não tenha sido totalmente honesto com ele.


Há muitos "Jerrys" em Jerry e há muitas "Lindsays" em Lindsay e isto talvez seja o grande atrativo do filme. Jerry é um homem que chegou aos 40 anos  sem ser o que a sociedade considera como um vencedor. Um homem de princípios que não aceita sofrer diárias ironias de um patrão prepotente. Um homem que entrou para o boxe novo, teve uma ascensão meteórica, ainda como amador e que, simplesmente, um dia, desistiu, abandonando tudo e resolvendo apenas ter uma profissão e viver sua vida. Mas há contas a pagar e namoradas a agradar. Ser apenas o que deseja não é uma opção numa sociedade que valoriza atributos e valores, não qualidades. Lindsay vê isso em Jerry: integridade, simpatia e simplicidade. Ela que se tornou defensora pública poderia estar advogando para causas mais vultuosas, mas resolveu seguir ajudando as pessoas e tendo uma vida simples. Jerry e Lindsay são tão parecidos no fim das contas. Só que a falta de perspectiva faz com que o seu passado o empurre novamente nos trilhos, ainda que tardiamente. Lutar aos 40 anos? Ir para as olimpíadas numa idade em que muitos já pararam? Jerry segue o fluxo. Lindsay parece ser a mulher de sua vida, mas o destino prega uma nova peça no casal: ela recebe uma oportunidade, imperdível, de se transferir para outra cidade e conseguir um ótimo e vantajoso emprego. Jerry segue vencendo, encontra um rival a altura: Robert Brown (Harold House Moore), jovem, rápido e considerado um futuro campeão, ainda que inexperiente. Só um pode ir para as Olimpíadas. Ambos seguem ganhando, ambos seguem seus sonhos. Um está iniciando sua jornada no boxe e outro, teoricamente, deveria estar terminando. Quem seguirá e quem ficará?



O Nocaute de Jerry é um filme simples com várias qualidades: fala do amor verdadeiro; fala de alcançar seus objetivos; fala da busca pela verdadeira felicidade em prol de uma vida confortável; fala em tomar a decisão certa, ainda que isto tenha um preço; fala de se ter integridade e caráter e ajudar o próximo; fala sobre a amizade; fala de como a sociedade trata os que estão na casa dos 40. 
A eficiência com que a estória nos é revelada é um dos trunfos do filme: as coisas vão acontecendo aos poucos, o relacionamento amoroso é mais moderado (fruto da idade dos protagonistas), as lutas são convincentes (algo raro no gênero). Tudo recheado de um humor fino e bom gosto. Um filme que vai numa crescente, com um final muito bem pensado que pegará alguns espectadores de surpresa.


A razão do filme ser desconhecido?  talvez um dos maiores motivos tenha sido o seu fracasso comercial. O filme não se pagou, conseguindo apenas metade do valor arrecado nos EUA (conforme site do IMDB). E, provavelmente, o seu maior empecilho: o filme recebeu da censura americana o código de censura ”R”, apenas para maiores de 18 anos (abaixo de 17, somente acompanhado dos pais). O mais curioso é que o filme não contém nenhum dos elementos característicos desta condição: violência, nudez, cenas de sexo ou uso de drogas. Talvez tenha sido por uns poucos palavrões.  As lutas de boxe, ainda que muito boas, não possuem a brutalidade que são expostas em certos filmes atuais.  Ou seja: foi o beijo da morte para a produção. O filme não arrecadou e o interesse por parte dos distribuidores ficou restrito. Por aqui andou passando no Telecine Touch.



Adam Carolla, boxeador amador e veterano da televisão a cabo americana, consegue surpreender com o seu "Hammer" ("Martelo" em inglês) apelido que conquistara como amador, mas por ter se tornado desconhecido pensam que é por ser carpinteiro. Heather Juergensen, que foi coprodutora do filme, junto com Carolla, fez uma Lindsay com uma ótima química com o Jerry de Adam. A atriz terminou sua (pouca) filmografia cinematográfica nesse longa.  Uma pena. Oswaldo Sanchez faz um Ozzie "Oz" divertido. O fiel escudeiro de Jerry é um amigo para todas as horas, ainda que tenha um bem vindo sarcasmo para criticar o amigo quando necessário. Oz é uma espécie de Pancho Villa a acompanhar seu amigo em seus sonhos. Harold House Moore dá credibilidade ao seu personagem, Robert Brown, um jovem talentoso que quer agarrar a chance de poder ser um campeão mundial e que vê, aos poucos, em Jerry, alguém mais do que um simples rival.



Vez por outra surge um filme desconhecido, de forma despretensiosa e que acaba sendo uma grata surpresa. O Nocaute de Jerry é um desses filmes. De baixíssimo orçamento, com uma direção (de Charles Herman-Wurmfeld  de "Legalmente Loira 2") e atuações inspiradas. Um filme pouco conhecido e difícil de ser encontrado.


Trailer:





Curiosidades:

O ginásio apresentado no filme foi construído por Adam Carolla e Oswaldo Castillo durante os anos de Adam como carpinteiro. Depois de completar o ginásio, Adam deu aulas matinais de boxe e Oswaldo foi contratado como o responsável da manutenção. 

O filme seria lançado em direto em DVD até Adam Carolla insistir que o filme fosse lançado nos cinemas. Ele arrecadou aproximadamente  $ 300 mil de seu próprio dinheiro para impressões e promoção a fim de financiar um lançamento limitado.

A rápida aparição da atriz Jane Lynch  do seriado "Glee"












Trilha Sonora:
Eye of the Tiger -  Survivor
You -  Bad Religion
Alive & Amplified - The Mooney Suzuki
Ring of Fire - John Oszajca



Poster:


 















 



Filmografia Parcial:
Adam Carolla
Splendor - Um Amor em Duas Vidas (1999); Louco Por Você (2000); As Aventuras de Frank McKlusky (2002); O Nocaute de Jerry (2007); A Casa Animada (seriado 2004 a 2007); A Casa Animada: O Filme (voz- 2010); Detona Ralph  (VOZ -2012).

Heather Juergensen
Beijando Jessica Stein (2001); Red Roses and Petrol (2003); Mansão Mal-Assombrada (2003); O Nocaute de Jerry (2007);

Harold House Moore
O Nocaute de Jerry (2007); Guardian of Eden (2012); Single Ladies (2011 a 1015); All Eyez on Me: A História de Tupac (2017);  Secrets (2017).